quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Raiders! (2015)

Em algum lugar dentro do meu armário está perdida uma fita VHS. Em algum ponto desta fita há uns cinco, seis minutos de uma gravação feita com uma câmera VHS da SHARP cuja bateria pesava mais do que a maioria das câmeras de hoje. A gravação mostra um riacho de onde sai uma fumaça misteriosa, feita com gelo seco, e pela "floresta" (um bosque na cidade de Vinhedo) anda um rapaz de uns quinze, dezesseis anos vestindo um chapéu de Indiana Jones (comprado na Chapéus Cury, em Campinas, que segundo a lenda forneceu o material para o chapéu original de Indy), uma jaqueta de couro e uma bolsa marrom pendurada no pescoço.

Este rapaz era eu.

Confesso que não sei se estas imagens realmente existem ainda ou se a tal fita está entre as dezenas de VHS que estão guardadas no meu armário; mas me lembrando daquele dia em que eu e um amigo fomos criar uma cena de Indiana Jones fica fácil entender a obsessão de três garotos americanos. Depois de terem assistido a "Caçadores da Arca Perdida" no cinema, Chris Strompolos, Eric Zala e Jayson Lamb resolveram que iriam refazer o clássico de Steven Spielberg cena a cena. O projeto, gravado em VHS no porão e nos arredores da casa de um deles, acabou durando mais de sete anos e os meninos foram crescendo em frente às câmeras. A adolescência e os problemas da vida adulta acabaram afastando os três. O filme, porém, foi terminado e, sem o conhecimento deles, ganhou fama no submundo dos festivais de cinema até que a fita foi parar nas mãos do ator e diretor Eli Roth, de filmes de terror como "O Albergue". Ele entrou em contato com os rapazes e organizou sessões que lotaram de cinéfilos e nerds em geral.  Steven Spielberg em pessoa tomou conhecimento do filme e chamou os rapazes para conhecê-los.

Tudo isso está em "Raiders!", documentário que a Netflix está exibindo em sua programação. Os fatos citados acima são bastante interessantes e o que o documentário tem de melhor. Há outro aspecto do filme, porém, que me deixou dividido. Os três rapazes são agora adultos com mais de quarenta anos, esposas, filhos, empregos, e eles resolvem que vão produzir uma sequência que não haviam conseguido fazer nos tempos de criança: a cena em que Indy luta com um mecânico grandalhão sob um avião em forma de asa. Se ver um grupo de crianças brincando de ser Steven Spielberg era divertido, fica bem menos interessante (e até um pouco bobo), porém, ver adultos tentando fazer o mesmo. As ótimas cenas de arquivo das crianças refazendo Indy são entrecortadas por longas sequências e entrevistas de quarentões negociando prazos, tentando levantar dinheiro ou simplesmente tentando manter o emprego. Há também aqueles momentos bregas (tipicamente americanos) em que a esposa diz que quer ver o marido feliz e que ele deve "seguir seus sonhos". Há também confissões sobre problemas com drogas, divórcios e os problemas da vida pessoal deles que, pessoalmente, não me interessavam.

No geral, porém, o documentário é bastante divertido e mostra como um filme pode mudar a vida de um grupo de garotos. "Caçadores da Arca Perdida" sempre foi meu filme preferido (não significa que seja "o melhor filme da História do Cinema", entendam a diferença) e perdi as contas de quantas vezes vi em VHS, DVD e, recentemente, em uma reprise na telona do cinema. É fácil ver como o filme fascinou aqueles garotos e os colocou para trabalhar. Quando eles crescem e ficam gritando uns com os outros, porém, fica menos interessante.

João Solimeo

domingo, 25 de setembro de 2016

Truman (2015)

Ainda meio sem saber o que falar sobre "Truman", esta co-produção Espanha/Argentina estrelada por Ricardo Darín. "Maravilhoso" seria um bom adjetivo. Filme sensível, tocante, triste sem ser piegas, engraçado sem ser histérico. É, antes de mais nada, Darín mostrando porque é um dos melhores atores do mundo. 

[Atenção, SPOILERS] Ele interpreta Julian, um ator argentino que mora na Espanha. Ele é divorciado, tem um filho de 22 anos morando em Amsterdan e um cachorro chamado Truman, que ele diz que é como se fosse outro filho. Um dia Julian recebe em seu apartamento Tomás (Javier Cámara), um amigo de longa data que veio visitá-lo do Canadá. Os dois se abraçam, Julian deixa o cachorro com uma vizinha e eles saem por Madrid para resolver alguns negócios pendentes. Primeiro visitam o veterinário de Truman, a quem Julian pergunta como é que um cachorro lida com a questão do luto. Julian pretende dar o cachorro para adoção e está preocupado com o modo como o cachorro vai sentir sua falta "depois que ele partir". Ao longo do filme eles visitam uma funerária, onde Julian precisa decidir se quer um enterro comum ou cremação. Finalmente visitam o médico de Julian, a quem o ator declara sua decisão de parar com a quimioterapia. "De que vai adiantar? Eu vou morrer de qualquer maneira, não vou?".

É assim que, lentamente, o espectador toma conhecimento de que Julian tem uma doença terminal e que, para espanto de amigos e família, ele está resignado com o diagnóstico e desistiu de lutar com o inevitável. Escrito e dirigido pelo catalão Cesc Gay (de "O que os homens falam"), "Truman" me lembrou um pouco de "As Invasões Bárbaras", do canadense Denys Arcand. Mas ao contrário daquele filme, quase todo passado em um hospital e nas derradeiras horas de um homem, "Truman" mostra Julian enquanto ele ainda parece saudável e com a vida toda pela frente, o que torna tudo ainda mais assustador. Julian se apresenta todas as noites no teatro (em uma versão da peça "Ligações Perigosas") e ainda tem forças para, em um impulso, pegar um avião e ir almoçar com o filho em Amsterdan (em uma das cenas mais tocantes do filme).

Vale repetir que, apesar do tema triste, este não é um filme piegas ou melodramático. A morte está à espreita no horizonte de Julian (e de todos nós um dia, não?) e ele tenta, no pouco tempo que lhe resta, resolver o destino de seu cachorro, colocar em ordem suas coisas e, principalmente, retomar a amizade com Tomás, que mais se parece como um irmão. O filme nos poupa da parte realmente ruim, quando a doença vai destruir este homem ("Eu era um galã!", diz Julian em dado momento). É uma história sobre o poder da amizade e da dificuldade em se dizer adeus, seja para um amigo, um filho ou um cachorro. (filme disponível no Google Play).

João Solimeo

sábado, 24 de setembro de 2016

Sete Homens e Um Destino (2016)

Claro que o que todo mundo vai perguntar se este filme é melhor do que a versão consagrada de 1960, dirigida por John Sturges. A resposta, claro, é não. Poucas coisas são mais cool do que Yul Brynner em um cavalo, certo? Ainda mais quando acompanhado de gente como Steve McQueen, Charles Bronson, James Coburn, Robert Wagner, etc (sem falar de Eli Wallach). A nova versão, porém, é bem melhor do que se poderia esperar, principalmente por causa do elenco.

Denzel Washington todo de preto montado em um cavalo não é nenhum Brynner, mas é, a seu modo, bastante cool. Chris Pratt está bem como o substituto de McQueen e o resto do elenco é composto por um ótimo Ethan Hawke (um pistoleiro traumatizado pela Guerra Civil), Vincent D´Onofrio como um rastreador, Buyng-hung Lee como um chinês especializado em facas, Manuel Garcia-Hulfo como um pistoleiro mexicano e Martin Sensmeier como um índio comanche. Como se vê, a versão "século XXI" da história primeiro contada por Akira Kurosawa em "Os Sete Samurais" (1954) tenta ser bem mais "inclusiva" do que o elenco totalmente branco do Western de Sturges. Há ainda um papel feminino bastante forte interpretado por Haley Bennett, que faz uma viúva que contrata Washington e seu bando para proteger uma pequena cidade de um cruel minerador chamado Bogue (Peter Sarsgaard, apropriadamente asqueroso mas um tanto exagerado).


O roteiro (co-escrito por Nic Pizzolatto, da extraordinária série True Detective, da HBO) segue de perto as versões de Kurosawa e Sturges, com algumas modificações. O grupo montado por Denzel Washington não só é mais diverso como também é mais ambíguo, principalmente na sua motivação. A versão de 1960 deixava claro que os camponeses podiam pagar muito pouco para os pistoleiros; já aqui, apesar do pagamento também ser pequeno, há implícita a promessa da divisão da grande quantidade de ouro que há nas minas da cidade. A direção é de Antoine Fuqua, que já trabalhou com Denzel Washington antes em "Dia de Treinamento" (também com Ethan Hawke) e "O Protetor". Fuqua dirige bem, sem pressa nem aquelas câmeras tremidas da maioria dos filmes modernos de ação. Há um bom senso da geografia da cidade e seus arredores. Os atores são bem dirigidos e há boa química entre Washington, Pratt e a garota, Bennett. A trilha foi a última composta por James Horner, que morreu em acidente aéreo em 2015, e tem várias de suas assinaturas conhecidas (como uso da flauta japonesa, o shakuhachi).

O ritmo lento é uma vantagem e um desvantagem. As (boas) cenas de ação acabam ficando um pouco dispersas pelos 132 minutos de filme. Quando as balas começam a voar, porém, vale a pena a espera. Dificilmente vai virar um clássico, mas para um Western moderno esta versão rende uma boa sessão de cinema.

João Solimeo

domingo, 18 de setembro de 2016

ARQ (2016)

Acho que já passou da hora dos roteiristas de ficção-científica aposentarem a ótima premissa da comédia "Feitiço do Tempo" (1993), utilizada muito bem em filmes como "Contra o Tempo" (2011) e "No Limite do Amanhã" (2014). A nova produção original da Netflix, "ARQ", segue exatamente a mesma ideia (com uma pequena modificação) mas não faz muito de novo com ela.

Renton (Robbie Amell, primo de Stephen Amell, de "Arrow") é um engenheiro que criou uma máquina que ele chama de "ARQ", que tem a aparência de um tubo metálico que fica girando constantemente. A tal máquina seria a lendária "máquina de movimento perpétuo", ou seja, ela gera a energia consumida por ela mesma (algo, até agora, fisicamente impossível). De quebra, a "ARQ" ainda tem um efeito colateral: ela é uma espécie de máquina do tempo que repete o mesmo dia seguidamente. Renton descobre isso por acaso. Todas as manhãs ele é acordado por três homens mascarados que o tiram da cama e o amarram, junto com a namorada Hannah (Rachel Taylor) e exigem que ele lhes dê todos os seus "créditos" (o dinheiro usado nesta distopia futura). Renton eventualmente é morto por algum de seus captores e acorda novamente no mesmo dia, pontualmente, às 6:16 da manhã.

E é isso. Você já viu este filme antes e, sinceramente, não há muita novidade aqui. O roteirista e diretor Tony Elliot acrescenta apenas uma mudança: com o passar das repetições, as outras pessoas ao redor de Renton também percebem que eles já viveram aquele dia antes e agem de acordo. O roteiro, porém, não aproveita muito as oportunidades que surgiriam com isto. Os diálogos são quase todos expositivos, ou seja, os personagens não conversam normalmente, mas apenas falam para explicar ao espectador o que está acontecendo. Sabemos que "alguma coisa" destruiu quase todo o mundo. Sabemos que há uma espécie de vírus solto no ar. Sabemos que existe uma "mega corporação do mal" (pleonasmo nestes filmes) chamada Torus que luta contra os "rebeldes" de um tal "Bloco". Nada, porem, é muito explicado. As repetições, depois de algum tempo, deixam de fazer sentido e parecem seguir apenas a conveniência do roteirista. Há uma cena em que o Renton e Hannah finalmente deixam a casa onde passaram todo o filme e você acha que vai ver alguma grande revelação lá fora, mas eles simplesmente voltam para dentro e tudo continua como antes. Ou seja, "ARQ" não tem nada de muito novo e não é uma boa pedida.

João Solimeo

domingo, 11 de setembro de 2016

Tallulah (2016)

Quem vê o poster de "Tallulah" entre as opções da Netflix pode pensar, por um momento, que se trata de uma continuação de "Juno" (2007, de Jason Reitman). Vemos Ellen Page segurando um bebê ao lado da atriz Allison Janney, que também estava naquele filme. "Tallulah" é uma produção original da Netflix escrita e dirigida por Siam Heder, atriz e roteirista que escreveu vários episódios da série "Orange is the new black" (também da Netflix). Este é seu primeiro longa metragem e é um filme bastante feminino, tanto no tema quanto na equipe que o produziu (a diretora de fotografia também é uma mulher, Paula Huidobro).

Ellen Page é Tallulah, uma órfã que mora em uma van com a qual cruza os EUA na companhia do namorado Nico (Evan Jonigkeit). Nico, cansado da vida nômade, abandona Tallulah e diz que vai voltar para casa, em Nova York. Tallulah chega antes do namorado à "Big Apple" e entra em contato com a mãe dele, Margo (Allison Janney), que mora em um apartamento enorme na Quinta Avenida. Tallulah não está sozinha; ela carrega no colo uma linda bebê e diz que ela é filha de Nico. Explicando: no dia anterior Tallulah havia sido confundida com uma camareira de um hotel por Carolyn (Tammy Blanchard), uma mulher que lhe pediu que cuidasse da filha aquela noite. A mulher estava claramente bêbada e não tinha nenhuma condição de ser mãe ou cuidar de uma criança, e Tallulah, em um impulso, acabou sequestrando a menina.


O filme, que poderia facilmente cair no melodrama, é bastante sensível e tem ótimos momentos causados pela química entre Page e Janney. Além da maternidade, um tema forte no filme é o abandono. Tallulah havia sido abandonada pela mãe aos seis anos de idade, que a largou em um orfanato e nunca mais voltou. A personagem de Allison Janney não só foi abandonada pelo filho Nico como pelo marido, que há três anos a trocou por outro homem (vivido por Zachary Quinto, o Spock dos novos filmes de Star Trek). Mesmo Carolyn, que a princípio é mostrada como uma mãe completamente irresponsável, acaba se revelando uma personagem complexa que tenta atrair a atenção do marido, que a renega. Há algumas conveniências, como o fato de demorar tanto para Nico chegar à Nova York e revelar a farsa de Tallulah, ou o fato de que ninguém a reconhece das notícias de jornal que mostram seu rosto. E há uma daquelas cenas difíceis de engolir quando um personagem encontra outro, sem querer, em uma cidade do tamanho de Nova York.

No geral, porém, "Tallulah" é um bom filme, muito bem interpretado e dirigido com competência. A cena final, cheia de poesia, é ótima. O filme está disponível na Netflix.

João Solimeo

O Homem nas Trevas (2016)

Stephen Lang é um veterano da guerra do Iraque que vive sozinho em um bairro pobre de Detroit. Ele ficou cego no conflito e divide a casa com um cachorro bastante assustador e uma série de travas na porta.

Rocky (Jane Levy), Alex (Dylan Minnette) e Money (Daniel Zovatto) são três jovens que se especializaram em pequenos assaltos em casas ricas da cidade, levando relógios e aparelhos eletrônicos que vendem por trocados para um chefão local. Rocky, particularmente, mal pode esperar para conseguir juntar dinheiro suficiente para deixar a decadente Detroit e se mudar para a ensolarada Califórnia com a irmã pequena. Um dia eles recebem a dica de que o veterano cego citado acima está sentado sobre uma bolada de dinheiro que ele teria recebido como indenização em acidente que matou a filha. Nada mais fácil do que roubar um velho cego, certo?

"O Homem nas Trevas" (Don´t breathe, no original) é um bom filme de suspense baseado nesta premissa simples. Os três jovens invadem a casa do cego (fazendo tanto barulho que, pelo jeito, eles também achavam que ele era surdo) e acabam enfrentando um antagonista muito mais preparado e letal do que eles imaginavam. O filme se passa quase todo dentro da casa, muito bem filmada pelo diretor Fede Alvarez (de "A Morte do Demônio") e seu fotógrafo, Pedro Luque. A câmera passeia pelos quartos e corredores com uma fluidez que me lembraram "O Quarto do Pânico", filme lançado por David Fincher em 2002. As primeiras cenas fazem um bom trabalho em explicar ao espectador a geografia da casa, o que vai ser útil ao longo do filme.


A premissa me lembrou também "Um Clarão nas Trevas" (1967), em que Audrey Hepburn fazia uma moça cega que tinha que enfrentar um grupo de ladrões. A diferença é que este filme é feito seguindo os passos de um filme de terror, ou seja, muitas cenas passadas na escuridão (quando o homem cego tem uma vantagem sobre seus oponentes), "jump scares" e suspense. Há também lugar para um segredo um tanto bizarro (e, sinceramente, difícil de acreditar) que o homem cego guarda na casa. Destaque para o elenco, principalmente pela escolha de Stephen Lang para interpretar o veterano. Por dois terços do filme ele mal diz uma palavra mas consegue passar medo apenas com seu rosto marcado.

"O Homem nas Trevas" não é nenhuma obra prima nem vai ficar para a História, mas é bastante competente em entregar o que promete: sustos e bastante suspense.

PS: o trailer abaixo contém vários SPOILERS, esteja avisado.

João Solimeo

segunda-feira, 5 de setembro de 2016

Aquarius (2016)

Em "AQUARIUS" Kleber Mendonça Filho trás de volta temas já explorados em seu ótimo filme de estreia, "O Som ao Redor", que era uma curiosa observação sobre o cotidiano de uma vizinhança do Recife, Pernambuco. É como se naquela mesma paisagem morasse uma jornalista e escritora aposentada chamada Clara (Sônia Braga, em grande sacada de Mendonça na escolha do elenco); ela tem 65 anos e mora sozinha em um prédio de dois andares chamado "Edifício Aquarius". Todos os apartamentos foram comprados por uma construtora que, quase que diariamente, assedia Clara para que ela também deixe o prédio. Em troca, eles oferecem uma compensação financeira acima da média do mercado.

Mas Clara não está interessada no dinheiro. Até porque ela o tem (e, aparentemente, muito; ela declara em uma cena que tem 5 apartamentos e várias outras fontes de renda). O apartamento no Edifício Aquarius é, ao mesmo tempo, o refúgio e a cápsula do tempo de Clara, que mora ali há décadas, criou os filhos, escreveu seus livros e enterrou o marido. Ela agora vive cercada por centenas e centenas de discos de vinil, livros, fotos (em papel) e móveis. Uma empregada "da família" é, ao mesmo tempo, cozinheira, babá dos netos de Clara e confidente. Os filhos grandes procuram não se envolver, a não ser Ana Paula (Maeve Jinkings), que é claramente a favor de que a mãe deixe o prédio. Ela inclusive entrou em contato com a construtora e andou conversando pelas costas da mãe (senti uma referência sutil a "O Poderoso Chefão" na cena em que Clara diz a Ana Paula que ela não deve negociar pelas costas dela). O filme é envolvente, embora extremamente lento. É necessário se adaptar ao ritmo da vida de aposentada de Clara, que passa os dias a escutar discos, ir à praia e visitar amigas e parentes. A intromissão da construtora afeta esta vida cuidadosamente controlada e revela uma Clara diferente da impressão calma que passa.

Com duas horas e vinte e dois minutos, há momentos que poderiam ter sido descartados na edição, como um prólogo passado na década de 1980, por exemplo, que não é tão relevante (a não ser fazer parte da viagem saudosista do roteiro e estabelecer que Clara havia tido um câncer, mas isto fica bem claro em outras partes do filme). Há cenas de sexo bastante explícitas que inclusive levaram, inicialmente, a uma classificação indicativa de 18 anos (baixada para 16 depois da pressão pública). Às vezes a tensão causada pela pressão da construtora acaba se perdendo em cenas um tanto repetitivas de Clara escutando discos ou em mais uma reunião de família. Neste ponto, achei que "O Som ao Redor" foi um trabalho melhor finalizado. Mas é um filme que cresce no espectador. Sônia Braga, estrela internacional que se encontrava praticamente aposentada, ganha nova vida com este filme e ela realmente está muito bem.

João Solimeo

Câmera Escura

sexta-feira, 2 de setembro de 2016

Star Trek: Sem Fronteiras (2016)

"STAR TREK: SEM FRONTEIRAS" é o terceiro filme do reboot de J.J. Abrams para a clássica série de fantasia/ficção científica. Neste, Abrams está apenas como produtor e o filme é dirigido por Justin Lin, que faz um bom trabalho em comandar a nova safra de atores que vivem os icônicos personagens de Kirk, Spock e companhia.
"Sem Fronteiras", em minha opinião, não é melhor que o primeiro reboot mas, sem dúvidas, é melhor que o segundo (em que resolveram mexer com o clássico "A Ira de Khan", com resultados duvidosos). Há muito humor e várias cenas envolvendo a "Santíssima Trindade" da Enterprise, Kirk (Chris Pine), Spock (Zachary Quinto) e McCoy (Karl Urban). Urban particularmente está se divertindo muito como o médico ranzinza da nave mais linda do Universo.
A trama (atenção SPOILERS SPOILERS SPOILERS) não é muito inspirada, mas ao menos não é uma reciclagem como fizeram com o segundo filme. Há um daqueles vilões genéricos com um plano de destruir a Federação, dezenas de sequências de ação em que não fica muito claro o que está acontecendo por causa da câmera nervosa de Lin e fugas mirabolantes da indestrutível tripulação da Enterprise. Ou melhor, do grupo principal, porque centenas de figurantes morrem como moscas neste filme. A própria Enterprise, coitada (e seguindo o que aconteceu com o terceiro filme do cinema) acaba destroçada em centenas de pedaços após enfrentar uma raça desconhecida de alienígenas.


A trilha de Michael Giacchino continua maravilhosa e além dele incorporar o tema original de Alexander Courage eu tive a impressão de escutar acordes da trilha que James Horner fez para Star Trek II e III dos filmes clássicos. Há uma sequência envolvendo a música Sabotage, dos Beatie Boys, que é ao mesmo tempo fantástica e ridícula, dependendo do ponto de vista.
Há uma cena envolvendo o jovem Spock remexendo nos pertences do velho Spock que se não tirar lágrimas do espectador é porque ele não é um verdadeiro fã da série. "Star Trek: Sem Fronteiras" está longe de ser perfeito, mas é uma space opera e tanto.