domingo, 22 de junho de 2014

Como Treinar seu Dragão 2

Esta continuação do sucesso da DreamWorks Animation de 2010 segue a tradição de que, como em "Star Wars", o segundo filme de uma série deve ser mais sombrio do que o primeiro. "Como Treinar seu Dragão 2" faz isso e muito mais. Quando escrevi sobre o primeiro filme, há quatro anos, disse que "o fato de ser um filme infantil impede que a ameaça dos dragões seja levada muito a sério pelo espectador, já que ninguém morre ou mesmo fica muito ferido nos ataques". Isto não é mais verdade. "Dragão 2" ainda é um filme infantil, bastante colorido, com várias piadinhas e uma corrida aérea inicial que lembra os jogos de quadribol da série Harry Potter; mas o nível de realismo foi elevado, tanto técnica quanto narrativamente.

É um prazer ver o nível de detalhes empregado na criação dos personagens e na iluminação dos cenários. O diretor de fotografia Roger Deakins novamente aparece nos créditos como consultor, e a iluminação desta animação é das melhores já vistas em uma computação gráfica. O 3D é usado com sabedoria e, felizmente, para realmente ampliar a sensação do espectador, e não como um artifício forçado para cobrar um ingresso mais caro. (leia mais abaixo)


Há também um aprofundamento muito maior nos personagens. O diretor/roteirista Dean DeBlois traz Soluço como um jovem de 20 anos que, após revolucionar a relação entre homens e dragões no primeiro filme, agora enfrenta uma nova ameaça; um vilão chamado Drago pretende escravizar todos os dragões e atacar a vila de Berk, onde moram Soluço e seus companheiros. O pai de Soluço, o teimoso Estoico, quer enfrentar o problema da forma Viking, ou seja, partir para o ataque. O rapaz, como sempre, discorda do pai e parte com Banguela para tentar uma solução diplomática. Ele encontra pelo caminho muito mais do que esperava, na forma de uma figura do passado, uma mulher chamada Valka que, assim como ele, também é amiga dos dragões. Há uma pitada de Hayao Miyazaki, o mestre animador japonês por trás de clássicos como "Princesa Mononoke" e "Vidas ao Vento", na personagem de Valka. A cena em que ela surge através das nuvens, mascarada e montada em um dragão, é puro Miyazaki. Pode-se perceber também uma influência japonesa no tom ecológico do filme e no design de um "dragão alfa" que vive em um santuário no meio do gelo. E quem diria que um blockbuster infantil se daria ao trabalho de criar uma longa e calma sequência romântica entre dois amantes do passado?

Claro que tudo termina em uma grande cena de luta, mas DeBlois a conduz com muita competência. Há uma grande dose de ambição na sequência em que dois dragões alfa, gigantescos, lutam ao fundo do cenário enquanto pequenas figuras humanas combatem em primeiro plano. Uma cena de sacrifício pode chocar as crianças (e adultos) presentes, mas isso só mostra como esta série evoluiu.

Assim, "Como Treinar seu Dragão 2" é bastante superior ao primeiro filme e um grata surpresa. Para ser visto em 3D, na tela grande do cinema.

sábado, 14 de junho de 2014

No limite do amanhã

"No Limite do Amanhã" usa uma variação da mesma premissa da comédia "Feitiço do Tempo" (Harold Ramis, 1993) e a transporta para uma aventura de ficção-científica. O que aconteceria se uma pessoa, ao morrer, voltasse sempre para o mesmo momento no tempo? Ela poderia fazer algo diferente ou estaria fadada a repetir tudo? Esta é a situação em que se encontra o Major Cage (Tom Cruise, do inferior "Oblivion"), um assessor de imprensa do exército que é enviado para a linha de frente por um general cruel. Cage não tem treinamento militar e, bem ao estilo "Dia D" (a invasão da Normandia, no final da 2ª Guerra Mundial), é despejado em uma praia vestindo uma armadura robótica tendo que combater centenas de aliens que vieram conquistar o planeta. Despreparado, Cage morre em poucos minutos, apenas para se ver vivo novamente no dia anterior à invasão; o ciclo se repete infinitamente, para desespero do Major, que Tom Cruise interpreta muito bem.

Tudo muda quando ele interage com uma heroína de guerra chamada Rita (Emily Blunt, de "Looper"), que lhe revela que ela também havia passado por isso. Cruise passa a se encontrar com Rita a cada reset e, aos poucos, vai treinando para se transformar em um soldado experiente. Eles têm que descobrir onde é que o "cérebro" dos aliens está escondido, para destruí-lo e vencer a guerra. Assistir a "No limite do amanhã" acaba se tornando muito similar a se jogar videogame. Os personagens conseguem chegar até certo ponto da história, quando morrem e voltam na "jogada" seguinte, mais experientes e sabendo o que vão encontrar pela frente. O diretor Doug Liman (especialista em filmes de ação como "A Identidade Bourne") faz um bom trabalho em explicar a trama e em conseguir filmar as mesmas situações, repetidas dia após dia, de forma ligeiramente diferente. (leia mais abaixo)


Há momentos em que você acha que Cage está passando por uma experiência pela primeira vez, até que ele acaba revelando que já passou por aquilo antes. A relação dele com a personagem de Emily Blunt é delicada, porque ele passa a conhecê-la intimamente e querer protegê-la, enquanto que, para ela, Cage é um estranho a cada vez que ele volta. Outro filme de ficção-científica recente, "Contra o Tempo" (de Duncan Jones) também explorava esta situação.

Uma pena que as sequências finais sejam pouco inspiradas e, francamente, não fazem muito sentido. Um ataque final ao esconderijo dos aliens seria muito mais inteligente se fosse feito de surpresa; ao invés disso, preferiram fazer uma explosiva (e impossível) cena de ação. Apesar de tudo, "No limite do amanhã" é inventivo e inteligente. Tom Cruise, apesar de já aparentar ser um cinquentão, ainda consegue levar um filme de ação nas costas sem problemas.

quinta-feira, 5 de junho de 2014

X-Men: Dias de Um Futuro Esquecido

O novo filme dos "X-Men" tem um pouquinho de tudo: um futuro distópico e sombrio que lembra "O Exterminador do Futuro" e a série "Matrix"; viagens no tempo para tentar mudar a História; robôs gigantes em batalhas apocalípticas e muitas referências à cultura pop, como uma TV exibindo um episódio da série clássica "Jornada nas Estrelas" ou um mutante usando uma camiseta do Pink Floyd. É recomendável que o espectador faça uma retrospectiva da série "X-Men" e os filmes do Wolverine antes de entrar no cinema, com o risco de se perder tentando lembrar como é que o Professor Xavier (o grande ator britânico Patrick Stewart, quando velho, e James McAvoy quando novo) está vivo ou em que estágio de evolução estão as garras de Logan (Hugh Jackman, cada vez mais musculoso).

"X-Men: Dias de um Futuro Esquecido" traz de volta à  série o diretor Bryan Singer, que fez os primeiros dois filmes e saiu para fazer uma versão de Superman que foi desprezada pelos fãs ("Superman: O Retorno", 2006). "X-Men 3: O Confronto Final", dirigido por Brett Ratner, também não agradou muito, o que não impediu que a franquia continuasse lucrativa. "Dias de um Futuro Esquecido" é, ao mesmo tempo, empolgante e uma bagunça, juntando o elenco da série original com os atores novos vistos em "X-Men: Primeira Classe" (2011). A premissa: em um futuro indeterminado, humanos e mutantes se tornaram escravos dos Sentinelas, robôs gigantes que foram criados originalmente para destruir os mutantes, mas acabaram atacando toda a humanidade. O Professor Xavier (Patrick Stewart) se une ao vilão Magneto (Ian McKellen, de "O Hobbit") e, com a ajuda de uma mutante interpretada por Ellen Page, envia a mente de Wolverine para o ano de 1973; a missão dele é impedir que Mística (Jennifer Lawrence, de "Trapaça") mate o futuro criador dos sentinelas, Trask, interpretado por Peter Dinklage, o Tyrion Lannister de "Game of Thrones". Se você se lembrou da trama de "O Exterminador do Futuro", não foi o único. (leia mais abaixo)


Singer se diverte em recriar o início dos anos 1970, com sua moda cafona, músicas de "paz e amor", Richard Nixon, a Guerra do Vietnã, etc. O jovem Magneto (Michael Fassbender, de "12 Anos de Escravidão", "Shame"), acredite se quiser, está preso no subsolo do Pentágono por supostamente ter matado o presidente John Kennedy (de que outra maneira se poderia explicar aquela bala em ziguezague que matou o presidente?). Esta mistura entre fatos históricos e ficção funcionam melhor neste filme do que em "Primeira Classe", que lidava com a Guerra Fria e a crise dos mísseis em Cuba. Hugh Jackman, o único elo de ligação entre passado e futuro, tem que tentar lidar com um desiludido Charles Xavier (McAvoy), viciado em uma droga que permite que ele volte a andar, mas fique sem os poderes telepáticos. Fassbender está muito bem (como sempre) no papel do megalomaníaco Magneto, capaz de levantar até um estádio de beisebol com seus poderes.

O mote da viagem no tempo quase sempre gera boas histórias. É fascinante imaginar se seria possível mudar o passado ou a própria história (ou a História). O problema são os paradoxos temporais (um homem poderia voltar no tempo e impedir seu nascimento? Se sim, quem voltou ao passado para fazê-lo?), mas este filme não está tão preocupado com eles. O que fica claro é que Bryan Singer usou do artifício das mudanças temporais para, de forma não muito sutil, dizer que "X-Men 3" não aconteceu (o que é boa notícia para a maioria dos fãs). Não chega a ser um reboot, mas "Dias de um Futuro Esquecido", assim como os "Star Trek" de J.J. Abrams, cria uma linha do tempo alternativa em que tudo é possível (inclusive dizer que todos os outros filmes da série, exceto "Primeira Classe", não aconteceram). Há boas sequências que fazem um diálogo entre as duas épocas (como um ataque dos Sentinelas); outras, como o ataque no início do filme, são editadas de forma confusa. "Dias de um Futuro Esquecido" foi bem recebido nas bilheterias, o que significa que a série tem futuro garantido no cinema.

Câmera Escura