O que fazer depois de dirigir um filme que custou 250 milhões de dólares e arrecadou quase um bilhão? Se você é Joss Whedon, você reúne os amigos, arruma uma casa grande, algumas câmeras e brinca de filmar Shakespeare. Depois do mega-sucesso de "Os Vingadores", Whedon quis baixar a poeira fazendo praticamente um vídeo caseiro de "Muito Barulho por Nada", uma comédia de William Shakespeare passada em Messina (Sicília), no século 16.
A versão de Whedon é ambientada nos dias de hoje em um local indeterminado (os personagens falam que estão em Messina, mas está tudo escrito em inglês). Filmado em preto e branco e com um visual bem caseiro, tem-se a sensação de que se está assistindo a um ensaio, e não a um filme "de verdade". Os atores são velhos conhecidos de Whedon e trabalharam com ele em séries de TV como "Buffy - A Caça Vampiros" ou "Angel". Fãs dos filmes da Marvel vão reconhecer Clark Gregg, mundialmente conhecido como o Agente Coulson, da organização SHIELD, interpretando o Sr. Leonato. A comédia de Shakespeare fala sobre os encontros e desencontros de alguns casais na propriedade de Leonato, que recebe a visita do príncipe Dom Pedro (Reed Diamond) e sua comitiva. O duque Cláudio (Fran Kranz) se apaixona à primeira vista pela filha de Leonato, Hero (Jilian Morgese) e os dois marcam o casamento para a semana seguinte. Só que o irmão invejoso do príncipe, Dom João (Sean Maher), trama para manchar a reputação de Hero, fazendo com que se acredite que ela está traindo Cláudio e não é mais "pura". Paralelamente, todos conspiram para tentar aproximar um casal "inimigo" por natureza, o irônico Benedick (Alexis Denisof) e a solteirona Beatrice (Amy Acker), fazendo-os acreditar que estão apaixonados um pelo outro.
Os diálogos são todos tirados da peça original e as interpretações são pouco convincentes. Amy Acker é quem se sai melhor como Beatrice; já Denisof é risível (no mau sentido) como Benedick. Não ajuda muito se você assistiu à versão tremendamente superior produzida, dirigida e interpretada por Kenneth Branagh há vinte anos. O filme de Branagh era banhado pela luz quente do mediterrâneo, belamente fotografado e interpretado por quem entende de Shakespeare (com exceção de Keanu Reeves e Robert Sean Leonard). A versão de Whedon soa como uma peça do colégio. E apesar de já terem sido feitas versões modernas bem sucedidas de Shakespeare, como "Coriolano" (dirigido e interpretado por Ralph Fiennes), ou mesmo o "Romeu + Julieta" de Baz Luhrmann, os temas tratados em "Muito Barulho por Nada" não combinam com a ambientação moderna. A questão de Hero ser ou não virgem, a submissão das mulheres e a glorificação do casamento podiam fazer sentido no século 16, mas não hoje. Assim, "Muito Barulho por Nada" pode servir como uma curiosidade, e talvez até funcione melhor na telinha da TV, mas é dispensável como cinema.