Não há como este ser um texto "jornalístico", baseado simplesmente em datas, feitos, acontecimentos. Morreu Roger Ebert, possivelmente o crítico de cinema mais famoso de todos os tempos e grande influência no meu modo de ver e escrever sobre filmes.
Comecei a ler as críticas de Roger Ebert através de um CD-ROM (lembram deles) chamado "Cinemania", produzido pela Microsoft e que continha resenhas de centenas de filmes escritas por vários críticos. Lendo os textos, percebi uma afinidade pelo modo de escrever e pelo gosto de Roger Ebert, o crítico do jornal Chicago Sun-Times desde 1967. Ebert ficaria famoso pelo programa de televisão que teve em parceria com Gene Siskel. Os dois criaram o modelo para um modo informal de falar sobre cinema na televisão, eram apenas dois críticos dando cada um sua visão sobre determinado filme e, basicamente, dizendo se recomendavam ou não. Sim, era por vezes simplista, mas fez grande sucesso e tinha o diferencial de não se tratar apenas de filmes blockbusters dos grandes estúdios. Siskel e Ebert também falavam sobre filmes europeus, sobre o início do cinema independente americano, e assim por diante, criando no público o hábito de experimentar filmes novos.
Com a morte de Gene Siskel, em 1999, Ebert teve outros parceiros no programa de televisão, mas se reencontrou em uma nova mídia: a internet. Praticamente todas as suas críticas escritas para o Sun-Times podem ser encontradas em RogerEbert.com, e se tornou um hábito, logo após voltar do cinema ou desligar o DVD, ir checar o que Roger havia achado do filme. Ebert não tinha medo de novas tecnologias e, com mais de 60 anos, era das personalidades mais visitadas no seu site, no twitter, Facebook e em seu blog, em que não falava só sobre cinema. Quando "Cidade de Deus" não foi indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, em 2003, eu escrevi um e-mail a Ebert perguntando o que havia acontecido, e ele respondeu em seu site que o processo de votação para esta categoria do Oscar estava ultrapassado. Fontes da Miramax haviam lhe informado que muitos dos votantes da Academia haviam sequer visto o filme até o final.
Roger Ebert descobriu um câncer em 2002, e lutou desde então contra a doença. Perdeu o maxilar e a capacidade de comer alimentos sólidos, assim como a capacidade de falar. Ao invés de desaparecer da mídia, Ebert se tornou mais presente do que nunca na internet. Escrevia centenas de críticas de filmes por ano, além de discutir sobre assuntos diversos como religião, política, racismo e outros temas em seu blog. Seus textos eram extremamente claros e podia-se notar o amor que ele tinha pela palavra escrita, pelo jornalismo à moda antiga, por encontrar a frase certa.
Há apenas dois dias Roger escreveu um post em seu blog em que agradecia a todos pelos 46 anos de carreira e avisava que iria desacelerar um pouco a produção de textos pois novamente lutaria contra o câncer. "Desacelerar", para Ebert, significava continuar a escrever sobre filmes (agora "só os que ele tivesse vontade"), além de supervisionar o Ebertfest, um festival de cinema que ele mantinha há mais de uma década. Hoje, infelizmente, vem a notícia de que Roger Ebert faleceu. Não só o cinema perde um grande crítico, mas o mundo perde um grande escritor, jornalista, ensaísta e, principalmente, cinéfilo.
Até mais, Roger Ebert.
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