O título brasileiro para "Cloud Atlas" não poderia ser mais apropriado (ou irônico). Feito a seis mãos, "A Viagem" é um épico que mistura gêneros, épocas e até mesmo raças para contar uma história geral a partir de seis tramas individuais. A direção, produção e roteiro é dos irmãos Andy e Lana Wachowski, criadores da série "Matrix", e do alemão Tom Tykwer, baseados em um livro escrito por David Mitchell. O filme é quase impossível de resumir. São várias histórias e diversos personagens interpretados por um mesmo grupo de atores, Tom Hanks (Tão Forte e Tão Perto), Halle Berry, Jim Sturgess, Jim Broadbent, Hugo Weaving (O Hobbit), Ben Whishaw (Skyfall), Doona Bae, Keith David e James Darcy, entre outros.
Em uma época em que os cinemas estão cheios de remakes, continuações e/ou adaptações de quadrinhos, é louvável que um filme original como este tenha sido feito. O problema com "A Viagem" é que ele promete muito mais do que efetivamente cumpre. A campanha publicitária para a produção, que foi um fracasso de bilheteria nos Estados Unidos, foi enorme e um trailer de aproximadamente seis minutos foi exibido por vários meses no Brasil, enaltecendo o lado "inspirador" e de "autoajuda" do filme, com direito a um narrador tentando explicar a história ao dizer que "tudo está conectado".
As tramas lidam, basicamente, com situações que mostram uma classe superior explorando uma classe inferior. No século 19, Jim Sturgess é um advogado que faz amizade com um escravo fugitivo que entrou como clandestino em um navio. Nos anos 1930, Ben Whishaw é um músico homossexual que começa a trabalhar para um grande (mas decadente) compositor interpretado por Jim Broadbent. Nos anos 1970, Halle Berry é uma jornalista que está investigando uma empresa corrupta que explora a energia nuclear. Em 2012, Jim Broadbent é um editor de livros que é enviado contra própria vontade a uma casa de repouso e tenta escapar. Em um futuro distante, na "Nova Seoul", Coréia, uma garçonete-clone chamada Sonmi-451 é recrutada pela rebelião para ser a líder da resistência contra a "Unanimidade". Um século depois, Tom Hanks vive em um mundo pós-apocalíptico em que sua tribo (que vive em um estado quase pré-histórico) convive com uma raça superior representada por Halle Berry, que quer enviar um sinal para colônias espaciais. Em todas estas histórias há uma relação entre uma casta superior e outra inferior, praticamente escrava, que quer se rebelar. Algumas tramas são muito mais interessantes que outras, em particular as que envolvem Ben Whishaw como músico, a Coréia futurista e principalmente a sociedade pós-apocalíptica vivida por Tom Hanks. Outras tramas são indiferentes ou mesmo desnecessárias; a que se passa na casa de repouso pode ter algumas das poucas cenas engraçadas do filme (que no geral é bastante sério), e Jim Broadbent é sempre um ótimo ator, mas poderia ser facilmente descartada.
O problema com as tramas principais é que todas, apesar de uma edição bem feita que as conecta, criam um suspense e uma expectativa de que "algo" muito relevante vai acontecer no final, prometendo uma "revelação" que não chega. Por mais interessante que seja a história da clone coreana vivida por Doona Bae, fica difícil entender porque a resistência precisa dela; o que é que ela tem a oferecer? Esta trama, aliás, lembra muito o próprio "Matrix" dos irmãos Wachowski e é fácil entender o que os atraiu para este roteiro. Na trama protagonizada por Tom Hanks e Halle Berry, eles sobem uma montanha e o espectador fica esperando que algo espetacular seja encontrado lá em cima, mas não. E quem é aquela figura sombria, vestindo uma cartola e totalmente fora de lugar, que fica assombrando o personagem de Hanks? E para um filme que supostamente quer celebrar a "vida", "A Viagem" apresenta algumas saídas discutíveis para alguns personagens, particularmente um que escolhe o suicídio. Tecnicamente impecável, "A Viagem" tem boa fotografia, edição, efeitos especiais e, claro, maquiagem. Nos créditos, aliás, é possível ver os personagens que cada ator interpretou. "A Viagem" é ambicioso e original mas, com quase três horas de duração, é um espetáculo interessante enquanto está sendo visto, mas que não deixa sua marca ao final.
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