Escrito pelo britânico J.R.R. Tolkien na década de 1930, "O Hobbit" era um livro infanto-juvenil leve, divertido e rico em detalhes, que contava a história de Bilbo Baggins (ou Bilbo Bolseiro), que acompanhava o mago Galdalf e 13 anões em uma aventura pela Terra Média. O grupo queria recuperar o ouro roubado pelo dragão Smaug e, no meio do caminho, Bilbo enfrentava uma série de aventuras; em uma delas, ele encontra no chão de uma caverna um grande anel de ouro que lhe dá o poder da invisibilidade. O livro foi um grande sucesso e Tolkien passou a vida escrevendo sobre a Terra Média e as aventuras em torno do anel encontrado por Bilbo. No século XXI, o neozelandês Peter Jackson embarcou na tarefa de transformar os três livros da série "O Senhor dos Anéis" em longos filmes que revolucionaram os efeitos especiais e puseram a Nova Zelândia no mapa cinematográfico mundial. O público respondeu com bilhões de dólares nas bilheterias e, inevitavelmente, sabia-se que Jackson voltaria à Terra Média com sua versão de "O Hobbit".
Só que o sucesso, assim como o Anel, é um aliado perigoso. Ao invés de fazer "O Hobbit" como um só filme de três horas, Jackson dividiu o livrinho em três partes, que prometem arrecadar o máximo de bilheteria possível para a New Line Cinema e os estúdios envolvidos na "franquia" de Tolkien. Com carta branca e precisando esticar ao máximo o roteiro (coisa que Jackson já faz normalmente), o roteirista/diretor traz a Terra Média de volta à telona em um filme com longas duas horas e cinquenta minutos de duração, um exagero. Não que "O Hobbit" seja uma experiência ruim de se assistir (apesar de ser voltado para um público dedicado). Jackson está à vontade com a mitologia criada por Tolkien e é um prazer rever Ian McKellen como o mago Gandalf. Também estão de volta, em pequenas aparições, Elijah Wood como Frodo e Ian Holm como o velho Bilbo. Interpretando o hobbit 60 anos mais novo está Martin Freeman, que faz um trabalho muito bom. Um numeroso elenco interpreta os 13 anões que, junto com Gandalf e Bilbo, partem para a "Montanha Solitária" para tentar recuperar o tesouro. Faz falta a presença sóbria de Viggo Mortensen, que interpretava Aragorn na trilogia anterior, mas o grupo de anões é divertido. A grande Cate Blanchett retorna como a Rainha dos Elfos, Galadriel, e sua beleza é um colírio como a única figura feminina em quase três horas de filme. Hugo Weaving também retorna como o sábio elfo Elrond, assim como Christopher Lee como Saruman.
O problema, repito, é a redundância do roteiro, claramente ganhando tempo para esticar a trama. Há longas sequências de flashbacks que explicam cada detalhe do passado dos personagens, assim como cenas intermináveis, como o jantar que acontece na casa de Bilbo antes da partida para a aventura. Outra questão é o uso excessivo dos efeitos digitais para criar centenas de vilões virtuais nas cenas de batalhas. Jackson se perde na sequência em que Gandalf e os anões fogem do interior da montanha dos orcs e há uma violência inconsequente (nenhum dos heróis chega sequer a se ferir). Há, porém, boas sequências, como a que mostra uma luta titânica entre gigantes de pedra, do tamanho de montanhas, que batalham sob a chuva. E o personagem Gollun, extraordinária criatura digital "interpretada" por Andy Serkis, continua o melhor ator da série. A trilha de Howard Shore repete quase todos os temas da trilogia original. A fotografia tem problemas; Jackson fez o filme em digital, em 3D e em um novo formato que grava a 48 quadros por segundo (contra os tradicionais 24 quadros por segundo do cinema), supostamente buscando uma qualidade melhor. O resultado é uma imagem ligeiramente embaçada e irreal, ao menos na cópia vista.
É um filme recomendável? Os fãs de "O Senhor dos Anéis", que não são poucos, certamente vão adorar. Outras centenas de espectadores vão assistir por impulso. Aos que não gostam de cinema de fantasia ou não têm paciência para ver anões correndo por quase três horas, melhor evitar. Visto no Kinoplex, em Campinas.
Um comentário:
Muito bom texto, João. Gostei muito. Fica a ressalva que o único cinema que está transmitindo o filme em 48 quadros por segundo de Campinas é o do Iguatemi. Sendo assim, é normal que a imagem pareça embassada (sensação que eu também tive ao assistir no Kinoplex). Cabe lembrar também que P. Jackson está usando de rascunhos não utilizados por Tolkien para a complementação da história, como é o caso do vilão representado pelo orc pálido. A personagem não aparece nenhuma vez no livro.
Felipe Ferreira Lima
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