"O Renato Russo era uma esponja de biografias de rock", diz Dado Villa-Lobos, da Legião Urbana, sobre seu ex-companheiro de banda, que morreu há 15 anos. Apesar deste tempo da morte de Russo e dos 30 anos do chamado "Rock dos anos 80", a mesma moçada que hoje escuta produtos como "Banda Cine" ou "Restart" canta as letras da Legião como se tivessem sido compostas ontem. "Rock Brasília - Era de Ouro", do documentarista Vladimir Carvalho, tenta explicar esta longevidade em um filme que, apesar de ser sobre vários grupos, é centrado da banda de Renato Russo, Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá.
O rock que surgiu em Brasília no final dos anos 70 e início dos 80 foi resultado de uma juventude bem de vida, estudada e com recursos, todos filhos de diplomatas, políticos ou membros da elite brasiliense. Na quadra conhecida como a "Colina" circulavam os membros do "Aborto Elétrico", banda formada pelos jovens que formariam a Legião Urbana e o Capital Inicial. Também por lá passavam Herbert Vianna, do Paralamas do Sucesso, e Phillippe Seabra, do Plebe Rude. O documentário mescla entrevistas atuais dos músicos com depoimentos de Renato Russo feitos por Vladimir Carvalho em 1988 e em uma longa entrevista que deu à MTV Brasil em 1994. Estranhamente, todas as entrevistas dos Paralamas são de arquivo do final dos anos 80; há apenas um depoimento atual de Hermano Vianna, irmão de Herbert, que conta como ele foi chamado a Brasília, no papel de jornalista, para fazer a primeira matéria sobre as bandas locais. "Foi uma matéria praticamente comprada", diz ele, rindo. Vianna completa dizendo que Renato Russo já era uma espécie de herói local e que já se comportava como uma estrela. O caminho para as bandas de Brasília foi aberto pelos Paralamas, que conseguiram entregar uma fita de Renato Russo para uma gravadora do Rio de Janeiro. Há uma parte engraçada que mostra como os produtores não sabiam o que fazer com a Legião Urbana. "Eles queriam me transformar em um Bob Dylan do cerrado", diz Russo. Outro momento, mais sério, mostra a confusão causada por um show da Legião em Brasília, em 1986, quando 40 mil pessoas se acotovelavam em um estádio para vê-los. Os primeiros acordes de "Que país é esse?" literalmente incendiaram a multidão, causando a reação da polícia, o ataque de um fã a Renato Russo e centenas de pessoas no hospital. Quando "Quatro Estações" foi lançado em 1989, a Legião Urbana foi alçada de vez ao estrelato, para espanto de Renato Russo que, irônico, diz que não era para ser um disco "pop". Ele cita os primeiros versos de "Há tempos": "Parece cocaína, mas é só tristeza. Talvez tua cidade. Muitos temores nascem do cansaço e da solidão".
O documentário tem acertos e erros. Tenta sair do lugar comum repetindo uma viagem que o Plebe Rude (e a Legião) fizeram para Patos de Minas, no primeiro show fora de Brasília dos grupos; por outro lado, dá muita importância para o Capital Inicial que, apesar do sucesso, nunca foram do mesmo calibre das bandas da época como Titãs, Paralamas e Barão Vermelho. O documentário por vezes perde o foco nas declarações da mãe e da irmã de Renato Russo e do pai de Fê e Flávio Lemos (do Capital Inicial). No geral, porém, traça um interessante perfil das bandas da época e, mais para o fim, contextualiza o final de uma era, causada pela morte de Renato Russo e pelos constantes problemas econômicos que o país atravessou. O documentário termina com um show feito pelo Capital Inicial em 2008 na "Esplanada dos Ministérios", para um milhão de pessoas. Tocando Legião Urbana, é claro.
Câmera Escura
Câmera Escura
Nenhum comentário:
Postar um comentário