O livro "Nosso Lar", de Chico Xavier, foi lançado em 1944 e é sua obra mais vendida. Ou, como preferem alguns, "Nosso Lar" é um livro ditado pelo espírito André Luiz a Chico Xavier em 1944 e é sua obra mais famosa. O livro agora ganha uma versão cinematográfica que entra para a história como o filme brasileiro mais caro de todos os tempos. Orçado em 20 milhões de reais, "Nosso Lar" é uma obra difícil de avaliar. Não é papel do crítico julgar seu conteúdo religioso ou se ele se trata de verdade ou ficção.
Mas não é tão simples. Retirado o conteúdo espírita de "Nosso Lar", o que sobra? Pode-se discutir os aspectos técnicos da obra, por exemplo. Os inúmeros efeitos especiais foram feitos por uma empresa canadense, "Intelligent Creatures", e contei nos créditos mais de cinquenta pessoas envolvidas. O filme segue um visual "new age" marcadamente azulado, com uma cidade construída em maquetes e pinturas que lembram uma Brasília superdesenvolvida. Ou, talvez, algum parque temático da Disney, na Flórida. Há diversos "ministérios" do mundo espiritual, como o "Ministério do Auxílio" e até um "Ministério da Comunicação" (haveria futuro para o jornalismo?).
Além da visão utópica, pacífica (e rapidamente entediante) do Nosso Lar, há também um purgatório anterior, chamado "Umbral", onde as almas ainda não preparadas têm que passar um tempo pagando os pecados. É para lá que, ao morrer, é enviado André (Renato Pietro), que durante sua vida terrena era um médico de cara amarrada e poucos amigos. Nós nunca o vemos fazer nada de realmente ruim, mas fica implícito que ele não era uma pessoa boa. A paisagem do "Umbral", também azul (mas escuro), é um lugar cheio de espíritos em agonia, sofrendo diversos tipos de tortura mental e física (embora eles sejam espíritos, certo?). André sofre por um bom tempo neste lugar, até que é resgatado por espíritos elevados que o levam até um hospital high tech e imaculado no Nosso Lar. Ele é apresentado ao lugar por Lísias (Fernando Alves Pinto), que lhe recita uma série de ensinamentos edificantes sobre o valor do trabalho, da paciência e do perdão. Há participações especiais de atores globais como Werner Schüneman (que faz outra figura conhecida do universo de Chico Xavier, Emmanuel), Othon Bastos e Paulo Goulart (um ministro que ensina André que também no mundo espiritual há burocracia e filas de espera). Ainda na parte técnica, "Nosso Lar" contém a trilha sonora de ninguém menos que o americano Philip Glass, um dos pais da moderna música orquestrada e do minimalismo. Glass está em piloto automático, com os acordes e arpegios de sempre, mas sua música dá um toque de classe ao filme.
Como cinema, "Nosso Lar" é uma experiência que tem seu interesse, mas que vai se perdendo aos poucos. O roteiro (do também diretor Wagner de Assis) é por demais "didático", cheio de lições de moral e lugares comuns, o que não é necessariamente ruim como auto-ajuda, mas como filme fica repetitivo e cansativo. Para quem não é "crente", pior são as partes que ficam descrevendo o funcionamento do Nosso Lar, com seus ministérios, sua burocracia, seus planos de reencarnação e assim por diante. Há também uma parte que é extremamente datada, falando sobre o início da II Guerra Mundial (que não havia sequer terminado no lançamento do livro). E com todo respeito à religião e aos admiradores do livro, a própria visão do mundo espiritual descrita no filme me pareceu tacanha. A idéia de uma "cidade espiritual" feita no século XVI (segundo descrição de Lísias) pairando sobre o Rio de Janeiro me pareceu muito pequena para o espírito humano (em tempo, não estou falando sobre o espiritismo).
"Nosso Lar", com toda probabilidade, será um grande sucesso nas bilheterias. É o tipo de filme que desafia críticas, já tendo seu público alvo definido e crescente no Brasil. O espiritismo está em alta no país, alavancado com o centenário de Chico Xavier, e provavelmente veremos mais filmes do gênero em um futuro próximo. (Visto no Topázio Cinemas)
7 comentários:
É realmente muito difícil avaliar um filme como o 'Nosso Lar'. Mesmo eu tendo uma certa queda pelo espiritismo, ainda é difícil de acreditar em alguns momentos do filme, como a cidade construída que lembram Brasília e os tantos Ministérios! (Pensei na mesma coisa sobre o Ministério da Comunicação! Pelo menos quando morrermos, não ficaremos desempregados! :P)
No geral é um filme muito bonito de se ver, principalmente para refletir. Fantasioso, sim. Mas eu gostei. :)
De certa forma o filme já é um marco no cinema nacional, nem que seja pelo esforço de imparcialidade que obriga os críticos a ter. Seja quem simpatiza ou não com o espiritismo.
E neste quesito acho que o João ganhou nota 10...rs
E aih Solimeo, blz?
Legal sua critica, mas tenho um senao..... Po Joao, pega leve!!! rsrsrs....
O filme por si soh jah eh um marco!!!
Quando eh que Holywood ia deixar de investir no cinema porrada, terror, sexo, comedia besteirol, para investir numa proposta mais seria como Nosso Lar....
Filmes como Ghosht, O ceu pode esperar, Os Outros, podem ter sido precursores, mas Nosso Lar, nao é fantasia (pelo menos para os Espíritas), e para os produtores que investiram.
Quebra de Paradigmas, com uma nova proposta de uma nova sociedade, quem sabe....
sao as respostas de tantas criticas que fazemos eco em nosso bom e velho Rock & Roll.
Shine On
Caro João,
percebi sua dificuldade de avaliar o filme, o que realmente não é fácil, pois em grande parte você decidiu abordar o conteúdo, embora tenha feito suas ressalvas super válidas. Mas já que foi por esse lado, o filme retratou muito bem concepções espíritas: As cidades espirituais realmente "pairam" sobre as físicas e são parecidas, mas sem a confusão típica das vibrações mais baixas; as sensações no mundo espiritual são análogas às físicas, principalmente quando se está demasiado preso à matéria; as casas deveriam ser realmente simples, pois a noção de riqueza que temos no mundo físico não se aplica; a II Guerra Mundial já havia começado, e a isto se refere o filme. Enfim, achei o filme muito inspirado e bem amarrado nesse sentido.
Abraços,
Sergio Ricardo Lima
João,
Numa avaliação geral, gostei da tua crítica. Mas acho que ela carece de mais substância. Parece-me que vc não leu o livro, não é isso? Porque a leitura prévia mudaria toda a ótica com que vc nortearia a crítica.
Quando André Luiz resolveu "escrever" o livro, queria dar alento ao ser humano, mostrando em minúcias um mundo melhor que espera as pessoas após a morte, desde que elas busquem se melhorar em suas vidas presentes. E, ao mesmo tempo, mostrar que o Universo pode se "esquecer" de quem prefere seguir outros caminhos...
Enfim, um livro pra incentivar o crescimento espiritual das pessoas. E ver isso agora transformado em filme, mesmo que tacanho, é uma grata surpresa pra todos que já o leram.
Abraço, meu amigo!
Eu disse que seria difícil pra vc ver esse filme, e mais dificil ainda tecer uma critica sobre ele.
o ser humano já é cheio de pré conceitos, e isso influencia direta e incisivamente sobre nossas opiniões, mesmo que essas tenham um proposito "profissional" como o seu.
nao vou julgar se sua critica é boa ou ruim, se o filme é bom ou ruim (mesmo pq só li o livro, e mto antes de pensarem no filme), mas acredito que vc fez bem o seu papel de ser humano: cheio de pré conceitos e dúvidas. rs
Bjs!
Como Clinton, também achei que o João conseguiu fazer uma crítica imparcial e cheia de insight. "Pré conceitos" parecem ter os que assumem que uma sociedade altamente burocrática baseada na valoração do trabalho medido em "bônus-hora" seja "um mundo melhor" ou uma sociedade melhor.
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