sábado, 31 de julho de 2010

Meu Malvado Favorito

Correndo por fora em um ano que teve animações da Pixar (Toy Story 3) e DreamWorks (Shrek), "Meu Malvado Favorito" surpreendeu público e crítica com um filme divertido e despretensioso. Produção da novata "Illumination Entertainment", a animação é dirigida por Pierre Coffin e Chris Renaud.

O bem humorado roteiro trata da história do auto-intitulado vilão Gru (voz de Steve Carrell, no original), um cara que não é mau de verdade, mas gostaria de ser. Vaidoso, mas ainda dominado pela mãe e por lembranças da infância, Gru usa seu poder para cortar filas na lanchonete ou arrumar um lugar para estacionar. Em sua mansão ele domina um grupo de centenas de "minions", empregados que lembram muito os alienígenas de brinquedo de Toy Story. Gru está mal humorado porque um novo vilão está atraindo a atenção da mídia, o mimado Vetor, que acabou de roubar uma das pirâmides do Egito. Para tentar superá-lo, Gru bola um daqueles planos mirabolantes apropriados a um super vilão: ele vai roubar a Lua! Mas, para isso, ele precisa de uma máquina encolhedora que está na fortaleza de Vetor. É então que surgem três garotinhas órfãs que, vendendo biscoitos, serviriam de porta de entrada para Gru. O vilão adota as meninas e as leva para casa. Sim, é o velho clichê do vilão duro que vai ter o coração amolecido pela inocência das crianças. Mas isso é feito com tanta graça que o filme supera o lugar comum e faz o espectador torcer por Gru e as meninas.

Gru é um personagem muito bem escrito. Ele tem um estilo que lembra os vilões europeus dos filmes em preto e branco, com sua elegância e sotaque do velho continente. Interessante os flashbacks que mostram sua infância e como sua criatividade foi sendo tolhida e podada pela mãe dominadora. Em uma cena em que ele vai colocar as meninas para dormir, ele repete o que, provavelmente, era um ritual da sua infância, dizendo a elas que a casa está cheia de pulgas e que há monstros no armário. Engraçada também a cena em que, decidido a cometer seu "plano maluco", Gru primeiro tem que ir pedir um empréstimo no banco, cujo gerente é um tal de Sr. Perkins, referência a Anthony Perkins, que interpretou o assassino Norman Bates no filme Psicose, de Hitchcock. A própria silhueta de Gru, a propósito, lembra a figura do famoso diretor inglês, mestre do suspense. Divertido.



Câmera Escura

Salt

É como se Jason Bourne tivesse uma irmã gêmea na figura esguia e sedutora de Angelina Jolie. "Salt" é um daqueles filmes de ação que só Hollywood consegue fazer, absurdo, fisicamente impossível, cientificamente inexplicável e tão verossímil quanto James Bond. Aceitando tudo isso e se deixando levar pela trama de ação e espionagem, "Salt" é diversão garantida, com a vantagem de ter um diretor de talento (Phillip Noyce) técnicos afiados e bom elenco.

Angelina Jolie é Evelyn Salt, uma agente da CIA que, no começo do filme, está prestes a largar a vida de ação pela pacata função de esposa e dona de casa quando, no último minuto, entra em cena Orlov (Daniel Olbrychski), um desertor soviético. Como todos que já viram o trailer sabem, Orlov faz uma revelação bombástica: Evelyn Salt seria uma espiã russa infiltrada nos EUA. Seu superior, Ted Winter (Liev Schreiber), até tenta ajudá-la, mas o agente Peabody (Chiwetel Ejiofor) quer prendê-la. Começa então o que pode ser resumido como uma série quase ininterrupta de cenas de perseguição, em uma mistura de Jason Bourne com "Corra, Lola, Corra".

Angelina Jolie é boa atriz. Seu início de carreira foi no telefilme "Gia", da HBO, em que interpretava uma top model viciada em drogas que foi das primeiras vítimas do vírus HIV. Ela ganhou um prêmio Emmy pelo papel e, em seguida, um Oscar pelo filme "Garota Interrompida". Mas sua beleza e corpo atlético a levaram para filmes de ação como a série "Tomb Raider" ou "Sr. e Sra. Smith", com o atual marido Brad Pitt e, a não ser em "A Troca", de Clint Eastwood, vimos pouco de Jolie como atriz "séria". Em "Salt" há pouco espaço para grandes interpretações, mas Jolie faz um bom trabalho em mostrar as várias facetas da suposta agente dupla soviética. Quem é "Salt", afinal? Seria membro do lendário programa soviético que teria treinado crianças para serem infiltradas nos Estados Unidos como agentes? Ou ela é uma americana leal que está sendo incriminada?

O roteiro, claro, é completamente absurdo. Há várias reviravoltas e surpresas que, apesar de funcionarem no momento do filme, não resistem a uma análise posterior. Apesar disso, o filme é competente o suficiente para prender a atenção e criar situações interessantes. O final deixa aberta a possibilidade de uma sequência. Jason Bourne que se cuide.


quarta-feira, 28 de julho de 2010

400 contra 1 - Uma História do Crime Organizado

Exibido no encerramento do III Festival Paulínia de Cinema, o longa “400 contra 1 – Uma História do Crime Organizado”, de Caco Souza, é confuso e não mostra a que veio. Ele se propõe a ser a biografia de William da Silva Lima, o principal idealizador da organização criminosa Comando Vermelho. Em plena ditadura, criminosos comuns e prisioneiros políticos dividiram as celas da colônia penal conhecida como “caldeirão do diabo”, na Ilha Grande. A convivência levou a uma troca de idéias entre os “subversivos”, que pregavam a revolução e o socialismo, e os presos comuns.

O tema já foi tratado, de forma muito melhor, pela cineasta Lúcia Murat em “Quase Dois Irmãos”, de 2004, com Caco Ciocler e Flávio Bauraqui. “400 contra 1” até começa bem, em 1980, mostrando um assalto a banco praticado pelo grupo de William (Daniel de Oliveira). A trilha sonora da época acompanha uma câmera nervosa e boa edição, prometendo um filme vibrante. Mas então começam os problemas. Em vinhetas exageradas e repetitivas, o filme dá saltos constantes no tempo, alternando datas nos anos 70, quando William foi preso na Ilha Grande, com outros momentos que mostram fugas de presos, reuniões do grupo fora do presídio e cenas de William com a amante interpretada por Daniela Escobar. Estes saltos no tempo são confusos e fora de ordem cronológica. Cenas dentro do presídio são intercaladas com outras fora, em épocas diferentes, e não fica claro exatamente qual a ligação entre elas. O filme não precisaria ter sido feito em ordem cronológica, mas estes pulos temporais não têm função alguma além de tentar dar ao filme um estilo moderno, não linear.

Para complicar, o ritmo é atrapalhado por uma narração teatral e panfletária de Daniel Oliveira, como William, que é redundante e desnecessária. Há também a personagem de uma jovem advogada (Branca Messina) que vai à Ilha Grande entrevistar os presos e supostamente revelar abusos de autoridade praticados pela direção do presídio, mas é também uma personagem perdida. O filme lembra, em alguns momentos, o alemão “O Grupo Baader Meinhof”, que também mostrava uma organização criminosa que agia, inicialmente, com fins políticos.

Por fim, falta ao filme explicar qual a importância de transformar a vida de William em filme. É o retrato de um revolucionário? É a celebração de um bandido? Em que a criação do Comando Vermelho mudou a história do Rio de Janeiro? Nenhuma destas questões é respondida satisfatoriamente e o que sobra é um filme com estilo truncado, muita violência e pouco conteúdo.


terça-feira, 27 de julho de 2010

Predadores

Em 1987, Arnold Swarzenegger estrelava um bom filme de aventura e ficção-científica chamado “Predador”. A produção tinha todas as marcas da década, como personagens musculosos, patriotismo americano e violência. O diretor John McTierman conseguiu criar uma boa dose de suspense enquanto cada ser humano, em meio à selva, era caçado e morto por um alienígena capaz de se camuflar entre a folhagem. O sucesso do filme gerou a obrigatória seqüência inferior em 1990 e dois inúteis exercícios chamados “Alien versus Predador”.

Como estamos em época de remakes e reboots de séries e franquias, o alienígena caçador volta aos cinemas agora sob a produção de Robert Rodriguez, que chegou a escrever um roteiro para um “Predador 3” ainda nos anos 90, e a direção de Ninrod Antal. A maior surpresa deste novo capítulo é o elenco. No lugar do halterofilista austríaco está Adrien Brody, ator oscarizado por sua interpretação em “O Pianista” e, provavelmente, a última pessoa em quem se pensaria para este papel.

Brody já flertou com blockbusters antes, fazendo o dramaturgo no King Kong (2005) de Peter Jackson, mas naquele filme ele era literalmente um peixe fora d´água. Em “Predadores” (agora no plural) ele é um mercenário chamado Royce, que começa o filme em queda livre, aterrissando com um estrondo em uma selva desconhecida. Ele não está sozinho. Também caem do céu o soldado russo Nikolai (Oleg Taktarov), uma militar israelense (a brasileira Alice Braga), um traficante mexicano (Danny Trejo), um médico (Topher Grace, aos 32 anos, ainda com cara de adolescente), um japonês da máfia yakuza (Louis Ozawa), um guerrilheiro africano (cujo nome real é Mahershalalhashbaz Ali) e um preso condenado à morte (Walton Goggins). São todos personagens clichês em uma situação inusitada. O que eles estão fazendo ali? Quem os jogou ali? E, o mais importante, onde é “ali”? A bússola não aponta para o norte e, o mais estranho, o Sol não se move (fato que é “esquecido” na parte final do filme, em que anoitece sem nenhuma explicação). As interpretações são acima da média para um filme do gênero e, ao menos na primeira metade, o roteiro é intrigante o suficiente para manter a atenção. O grupo é atacado por uma espécie de cachorro alienígena com longos chifres e eles chegam à conclusão de que estão sendo caçados por “alguma coisa”.

O filme se perde justamente no momento mais promissor. Eles encontram outro “náufrago” deixado naquele planeta, interpretado pelo grande Laurence Fishburne. Ele sobreviveu a dez “temporadas de caça” e mora em uma espécie de “máquina” alienígena, onde se esconde e conversa com um companheiro imaginário. Fishburne é bom ator e seu personagem causa a impressão que teremos um roteiro inteligente dali para frente. Infelizmente, a sensação dura pouco. Logo o filme apela para os clichês do gênero, como perseguições em corredores escuros e mortes violentas. Há até uma cena que de tão absurda chega a ser engraçada. Um dos Predadores, que poderia destruir um ser humano facilmente com um tiro de laser, enfrenta o japonês da yakuza em uma luta de espadas samurai. Adrien Brody assume seu lado personagem de ação “marombado” e exibe um corpo musculoso, com barriga tanquinho, enquanto entra na “porrada” com outro Predador.

Como blockbuster de ação, “Predadores” até diverte e se desenrola como o esperado de um filme do gênero. Há muitas explosões, tiros, sangue vermelho (humano) e verde (alien) e até um final aberto para uma continuação. Quem sabe? No próximo talvez chamem Sir Anthony Hopkins para um papel. Hannibal versus Predador? Sucesso garantido.


segunda-feira, 26 de julho de 2010

O Pequeno Nicolau

"O Pequeno Nicolau" é vibrante, divertido e deliciosamente nostálgico. O filme remete a uma época em que as crianças brincavam na rua sem medo, não havia computadores em casa e a imaginação reinava solta. Nicolau (o ótimo Maxime Godart) é um garoto que não sabe o que vai ser quando crescer. Segundo ele, isso acontece porque ele adora sua vida como é hoje. Seu pai (o engraçado Kad Merad, de "A Riviera não é aqui") é um empregado esforçado que está tentando uma promoção no trabalho. Sua mãe (Valérie Lemercier) o adora e, segundo Nicolau, "sempre quis ser mãe" (sim, junto com a nostalgia o filme também remete a um tipo de sociedade machista do século passado, mas com boas intenções).

Um dia, na escola, a professora (Sandrine Kiberlain, de "Mademoiselle Chambon") conta à classe a história do Pequeno Polegar, que foi abandonado pelo pai na floresta. Um garoto da sala, Joachim (Virgile Tirard), conta outra história assustadora aos amigos: ele ganhou um irmãozinho; o bebê recebe toda atenção da casa e seus pais estão agindo de forma muito estranha e sendo amáveis um com o outro. Nicolau, com sua grande imaginação, acha que seus pais também vão ganhar um bebê e, assim como na história do Pequeno Polegar, vão levá-lo para a floresta e deixá-lo lá. Há uma cena muito engraçada em que, de fato, os pais vão até a floresta e Nicolau, precavido, se tranca dentro do carro.

O filme de Laurent Tirard é baseado nas histórias do quadrinista René Goscinny, criador das ótimas HQ de "Asterix, o Gaulês". Tirard conduz o filme com leveza e grande apuro técnico. Tudo funciona muito bem, como a direção de arte, fotografia e efeitos especiais invisíveis, que recriam a França dos anos cinquenta. O elenco infantil é impecável. Há os tipos que todo mundo já conheceu um dia, como o comilão da sala, o sabe-tudo "puxa-saco" da professora, o distraído, o riquinho e assim por diante. O roteiro é inteligente por mostrar a ingenuidade do mundo infantil não só no que tem de gentil, mas também no que tem de egoísta ou mesmo cruel. Nicolau, assustado com a idéia de ser abandonado pelos pais, começa a fazer planos cada vez mais malucos para se livrar do susposto irmãozinho. Ele e a turma planejam contratar um "gângster" para sequestrar o bebê. Mas como conseguir o dinheiro para pagá-lo?

"O Pequeno Nicolau" é uma opção inteligente para levar as criaças aos cinemas nas férias. Certifique-se de deixar claro que eles não vão ser abandonados na floresta depois.


domingo, 25 de julho de 2010

Mademoiselle Chambon

Ao fazer programa duplo no Cine Topázio, em Campinas, eis que deparo com a mesma atriz nos dois filmes. Após assitir ao ótimo e engraçado "O Pequeno Nicolau", mudei de sala para ver o drama "Mademoiselle Chambon". A atriz é Sandrine Kiberlain que, curiosamente, interpreta uma professora primária nos dois filmes. Mas enquanto "Nicolau" é um filme leve e engraçado, Mademoiselle Chambon é um sensível drama de amor. É notável a sutileza do diretor Stéphane Brizé ao contar a história do pedreiro Jean (Vincent Lindon) e da professora Véronique Chambon, que dá aulas para o filho de Jean. Ele é um trabalhador braçal, casado com Anne-Marie (Aure Atika) e pai de Jérémy (Arthur Le Houérou). Um dia a professora o convida para se apresentar à classe do filho para falar sobre seu trabalho. Apesar do pouco estudo e do trabalho duro, Jean se revela articulado e apaixonado pelo trabalho, o que atrai discretamente a atenção da solitária Mademoiselle Chambon. Ela lhe pede que vá consertar uma janela com problemas na casa dela, e o que se segue é uma das sequências de tensão amorosa e atração sexual mais bem feitas do cinema. Os dois estão sozinhos no apartamento, ela corrigindo provas no quarto enquanto ele está na sala fazendo o serviço. Percebe-se que os dois estão interessados, mas de maneira quase envergonhada, tímida. Ele é casado. Ela dá aulas para o filho dele. Eles sabem que estão "errados", sabem que é "impossível"; mas também sabem que, em uma outra realidade, os dois poderiam ser ideais um para o outro.

Jean é um homem íntegro, que não está interessado em trair a esposa. É também bom filho e toma conta do pai, que está doente. Mas há algo na professora que lhe atrai muito, e não é apenas uma coisa sexual. Em uma bela cena, ele lhe pede que toque alguma coisa no violino. Ela fica envergonhada e, a princípio, se recusa. Ele insiste. É bom ver um filme, hoje em dia, em que um homem e uma mulher não pulam direto para a cama. O amor que surge entre os dois é genuíno e, como toda paixão, sofrida. Para complicar, Jean descobre que a esposa está grávida. E agora? De seu lado, a solitária Chambon recebe uma oferta para ser efetivada na escola do filho de Jean. Será uma boa idéia? Não seria melhor partir enquanto ainda é tempo?

Mademoiselle Chambon é um filme de longos silêncios e olhares, em que o não dito fala mais do que muitas palavras. A dor da paixão não consumada é expressa na música clássica do compositor Elgar, em notas de violino. Ótimo filme.


sexta-feira, 23 de julho de 2010

Premiação: III Festival Paulínia de Cinema

Filmes de longa-metragem

Melhor Filme ficção: R$ 150 mil - 5xfavela – Agora por nós mesmos, de Manaira Carneiro, Wagner Novais, Rodrigo Felha, Cacau Amaral, Luciano Vidigal, Cadu Barcellos, Luciana Bezerra
Melhor Documentário: R$ 50 mil – Leite e Ferro, de Claudia Priscilla
Melhor Diretor ficção: R$ 35 mil – Flavio Tambellini, por Malu de Bicicleta

Melhor Diretor Documentário: R$ 35 mil – Claudia Priscilla, por Leite e Ferro
Melhor Ator: R$ 30 mil – Marcelo Serrado, por Malu de Bicicleta
Melhor Atriz: R$ 30 mil – Fernanda de Freitas, por Malu de Bicicleta
Melhor Ator coadjuvante: R$ 15 mil – Marcio Vitto, por 5xFavela – Agora por nós mesmos , episódio Acende a Luz
Melhor Atriz coadjuvante: R$ 15 mil – Dila Guerra, por 5xFavela – Agora por nós mesmos , episódio Acende a Luz
Melhor Roteiro: R$ 15 mil – Rafael Dragaud, por 5xFavela – Agora por nós mesmos

Melhor Fotografia: R$ 15 mil – Gustavo Hadba, por Bróder
Melhor Montagem: R$ 15 mil – Quito Ribeiro, por 5xFavela – Agora por nós mesmos
Melhor Som: R$ 15 mil – Miriam Biderman e Ricardo Reis, por Bróder
Melhor Direção de arte: R$ 15 mil – Alessandra Maestro, por Bróder
Melhor Trilha Sonora: R$ 15 mil – Guto Graça Melo, por 5xFavela – Agora por nós mesmos
Melhor Figurino: R$ 15 mil – Marcia Tacsir, por Desenrola
Especial Júri: R$ 35 mil - Lixo Extraordinário, de Lucy Walker, João Jardim e Karen Harley

Filme de curta-metragem - Nacional

Melhor filme: R$ 25 mil – Eu Não Quero Voltar Sozinho, de Daniel Ribeiro
Melhor Direção: R$ 15 mil – Cesar Cabral, por Tempestade
Melhor Roteiro: R$ 10 mil – Daniel Ribeiro, por Eu não quero voltar Sozinho

Filme de curta-metragem - Regional

Melhor filme: R$ 25 mil – Depois do Almoço, de Rodrigo Diaz Diaz
Melhor Direção: R$ 15 mil – Jonas Brandão, por Um Lugar Comum
Melhor Roteiro: R$ 10 mil – Elzemann Neves, por Depois do Almoço

Júri Popular

Melhor longa ficção: R$ 25 mil - 5xfavela – Agora por nós mesmos, de de Manaira Carneiro, Wagner Novais, Rodrigo Felha, Cacau Amaral, Luciano Vidigal, Cadu Barcellos, Luciana Bezerra
Melhor documentário: R$ 15 mil – Lixo Extraordinário, de Lucy Walker, João Jardim e Karen Harley
Melhor curta metragem nacional: R$ 5 mil – Eu Não Quero Voltar Sozinho, de Daniel Ribeiro
Melhor curta-metragem regional: R$ 5 mil - Meu avô e eu, de Cauê Nunes


Prêmio da Crítica

Melhor curta-metragem: Eu Não Quero Voltar Sozinho, de Daniel Ribeiro

Melhor longa-metragem: Bróder, de Jefferson De

fonte: http://www.culturapaulinia.com.br/



quinta-feira, 22 de julho de 2010

7º Dia: III Festival Paulínia de Cinema

Terminou ontem a fase competitiva do III Festival Paulínia de Cinema. Hoje será exibido o filme “400 contra 1”, de Caco Souza, fora de competição, e serão anunciados os vencedores. O Theatro Municipal de Paulínia estava com lotação esgotada, neste último dia aberto ao público, que teve a exibição do ótimo documentário “Lixo Extraordinário”, que foi aplaudido em pé, e o longa de ficção “Bróder”, de Jéferson De.

A animação de bonecos “Dona Tota e o Menino Mágico”, de Adriana Meirelles, tem visual bem colorido e animação básica. A diretora fez mestrado em animação na University of West of England, e disse que o curta foi animado “à distância” por diversas pessoas, em várias partes do mundo. O resultado é um trabalho irregular, com animação simples e diálogos difíceis de se entender.



Lixo Extraordinário” comoveu o público com sua inspirada mistura de histórias de vida, biografia de um artista e projeto ecológico. O documentário, dirigido a seis mãos por João Jardim (Janela da Alma), Karen Harley e Lucy Walker, é uma co-produção entre a produtora brasileira O2 Filmes (de Fernando Meirelles) e da britânica Almega Projects. O artista plástico brasileiro mais bem sucedido no momento, o paulista Vik Muniz, resolveu fazer um projeto no aterro sanitário Jardim Gramacho, no Rio de Janeiro, o maior da América Latina, fotografando alguns personagens e criando suas famosas obras de arte feitas com material reciclado. Vik é visto em Nova York, onde mora e tem um estúdio, mostrando o lugar onde ele mesmo, anos atrás, trabalhou limpando o lixo. Em seguida, o contraste: hoje suas obras estão expostas no MOMA, o museu de arte moderna de Nova York.

Vik e o sócio Fábio vão para o Brasil e é interessante como eles, ao chegar ao aterro de Gramacho, parecem estrangeiros no próprio país. Gramacho é um mundo à parte, com um fluxo constante de caminhões despejando lixo, urubus voando e, em meio à montanha de dejetos, seres humanos, os catadores de lixo. Dentre as centenas de trabalhadores, Muniz escolhe alguns personagens. Tião e Zumbi são da Associação dos Catadores de Lixo, e Zumbi sonha em montar uma biblioteca comunitária com os livros encontrados diariamente no aterro. Tião fala com desenvoltura sobre o “Príncipe”, de Maquiavel, que leu depois de deixar o livro molhado secando atrás da geladeira do barraco onde mora. Ísis está no aterro há cinco anos e acha o trabalho “péssimo”, mas é melhor do que “rodar bolsinha” na praia. Com lágrimas nos olhos, ela fala sobre a morte do filho de três anos, vítima de pneumonia. Suelen tem 18 anos e trabalha desde os sete. Já tem dois filhos pequenos que vê uma vez a cada 15 dias, porque mora em um barraco alugado no próprio lixão. Até o final do documentário, ela engravida novamente e tem o terceiro filho. Irmã trabalha no aterro e é cozinheira para os companheiros. É chocante a cena em que a vemos cozinhando em pleno lixão, cercada por dejetos por todos os lados.

Vik Muniz tira fotos destes personagens e os leva para um grande galpão, onde os próprios fotografados e colegas montam suas imagens em gigantescas obras de arte que, vistas de cima, se revelam. Muniz disse ao público presente ao festival, antes da exibição do filme, que o documentário era sobre “reciclagem humana” e sobre o poder transformador da arte. É emocionante a seqüência em que Muniz leva Tião a uma casa de leilão em Londres para vender sua própria foto. O dinheiro arrecadado por todas as obras foi revertido depois para a própria comunidade, mudando a vida dos catadores de lixo.

“Lixo Extraordinário” tem excelente direção de fotografia e trilha sonora de Moby, especialmente eficiente nas cenas que mostram as toneladas de lixo sendo despejadas no aterro, atacadas imediatamente pelos catadores. Causa certa estranheza, apenas, o fato de que Vik e seu sócio, dois brasileiros, conversem entre si em inglês quase o tempo todo. Isso foi feito para as platéias internacionais, claro, mas soa um pouco irreal. É também levantada a questão de como esse projeto iria afetar os próprios catadores. Muniz é enfático; se o projeto causar uma mudança de atitude nos envolvidos, querendo uma vida melhor, melhor para eles. Tião e Zumbi estavam presentes em Paulínia, e o discurso de Tião foi igualmente emocionante. Ele disse que eles não são catadores de lixo, mas de material reciclável. “Lixo é o que ninguém quer”, diz ele, enquanto que material reciclável tem valor. O documentário foi aplaudido em pé durante todos os créditos finais, e os aplausos continuaram quando as luzes do teatro foram acesas. É o novo favorito do Festival de Paulínia.



Ensolarado”, de Ricardo Targino, também chamou a atenção pelo discurso do diretor antes da sessão. Ele disse que fez o filme “à moda antiga”, em película de 35 mm e editado mecanicamente, na moviola. Targino disse que “nosso cinema tem um compromisso estético, político, afetivo e familiar com este grande Brasil”. Disse também que era uma alegria apresentar à pequena Ariane, a atriz mirim do curta, o cinema pela primeira vez. Ele chamou o filme de “uma pequena sementinha que estamos plantando neste país ensolarado”. O curta realmente é bastante bonito, com fotografia que mostra a força do Sol no sertão de Minas Gerais e enquadramentos primorosos. Depois de várias exibições de curtas digitais nos últimos dias foi bom ver a boa e velha película cinematográfica na tela.

Um segundo curta na categoria “Curta Nacional” foi exibido ontem, “Retrovisor”, de Eliane Coster. Também em 35 mm, o filme mostra a vida de um garoto (Douglas Valdez) que limpa pára-brisas no semáforo, em São Paulo. Um dia um fotógrafo deixa cair um rolo de filme na rua e o garoto o pega. Ele fica imaginando o que haveria dentro daquele rolo. O curta resgata algo de “mágico” que a fotografia digital nos tirou: a expectativa de fotografar sem poder ver na hora o resultado. Claro que as câmeras fotográficas digitais são muito mais práticas, mas havia algo de mágico em usar o filme tradicional e esperar a “revelação” (palavra com vários significados) das fotos.

O último longa-metragem de ficção exibido no festival foi “Bróder”, de Jeferson De. O filme foi feito no Capão Redondo, na periferia de São Paulo, e acompanha um dia na vida de três amigos, Macu (Caio Blat), Jaime (Jonathan Haagensen) e Pibe (Sílvio Guindane). Jaime é um badalado jogador de futebol que estava jogando na Espanha, mas está contundido, sendo dúvida para a escalação da seleção brasileira. Ele está em São Paulo para uma avaliação médica e para tentar se acertar com Elaine (Cíntia Rosa), que está grávida dele. Pibe é formado em Direito e se mudou da periferia para o centro da cidade. Ele se casou e tem um filho pequeno, mas a vida não está nada boa para o casal. Macu, branco, está fazendo aniversário e sua mãe (Cássia Kiss), lhe prepara uma festa surpresa. Ele está devendo dinheiro para um traficante barra pesada e precisa fazer um trabalho para quitar sua dívida. Os três amigos se reencontram no Capão Redondo em uma cena insólita, em que o carrão do jogador Jaime contrasta com a pobreza do lugar e com o fato de haver um corpo jogado na calçada, com a família aos prantos.

Jeferson De brinca com a questão do que é ser negro ou branco em uma periferia. Quando o filme começa, por exemplo, vemos uma silhueta falando ao celular, usando de muitas gírias, e imaginamos na hora ser um personagem negro. Quando a cortina deixa a luz entrar, vemos que é Caio Blat. Cássia Kiss, branca, interpreta uma mulher evangélica que freqüenta uma igreja cujo pastor e João Acaiabe, negro, e é casada com Aílton Graça, outro ator negro. Como se vê, a pobreza não tem cor. Mas há uma cena que mostra o preconceito ainda existente na sociedade. Quando Macu, Jaime e Pibe estão “dando um rolê” pela cidade no carrão de Jaime, a polícia os para e começa a prender os dois negros, achando que estavam seqüestrando o branco.

A trilha sonora tem sucessos de Mano Brown e Jorge Ben Jor, entre outros, e o filme soa bastante autêntico. A produção contou com o apoio de ONGs do Capão Redondo que garantiram que quase todo o filme fosse rodado no próprio bairro. Os atores estão muito bem e Caio Blat, em especial, surpreende. Interessante também a coincidência da história de Jaime, jogador de futebol que engravidou uma moça de periferia, e as notícias do goleiro Bruno e a antiga amante. Belo filme, que muda um pouco o cenário das tradicionais favelas do Rio de Janeiro para a periferia de São Paulo, igualmente perigosa e cheia de histórias para contar.


quarta-feira, 21 de julho de 2010

6º Dia: III Festival Paulínia de Cinema

Pode-se dizer que “sexo” foi a palavra-chave nos filmes exibidos ontem no Festival de Paulínia. Com exceção do documentário “Programa Casé”, tanto os curtas-metragens quanto o longa-metragem tinham tramas que envolviam, de alguma forma, o sexo.

Depois do Almoço”, de Rodrigo Diaz Diaz, participou de um projeto chamado “Fucking Different”, um filme coletivo que tinha a proposta de fazer curtas lidando com o homossexualismo. Os diretores homens teriam que falar sobre a homossexualidade feminina, e as mulheres da masculina. O curta de Diaz mostra uma família brasileira aparentemente comum em um almoço de domingo. Os homens estão vendo futebol, as crianças brincando e as mulheres, Naná (Lulu Pavarin) e Andréa (Gilda Nomacce), compartilham um cigarro na varanda. A conversa começa a tomar rumos eróticos quando uma delas mostra para a outra uma revista com homens nus. Depois ela começa a contar um sonho erótico que teve com a outra, e a situação vai ficando cada vez mais “quente”. O bizarro da cena é que as duas mulheres não tem o visual esperado em um filme erótico desse tipo, lindas e saradas, mas sim mulheres comuns, de meia idade e acima do peso, dizendo frases típicas de um filme pornô. Produção mediana, com fotografia digital e interpretação exagerada (antes mesmo da cena de “sexo” entre as duas).

Programa Casé”, de Estevão Ciavatta, conta a história de Ademar Casé, pernambucano que foi para o Rio de Janeiro na década de 1930 e, segundo o documentário, foi pioneiro em várias práticas do rádio moderno. Ademar era avô da atriz Regina Case, que estava presente em Paulínia, junto com vários outros membros da família. O diretor disse que o material sobre Ademar lhe foi passado pelo tio de Regina, que não sabia bem o que fazer com ele. Ciavatta descobriu que Casé havia contratado grandes nomes da música brasileira como Noel Rosa, Braguinha e Carmen Miranda, que cantavam regularmente em seu programa de rádio. Regina Casé disse que não conhecia a história do avô e que, vendo o documentário, descobriu o porquê dela mesma fazer televisão. Ela também disse que estava curiosa sobre como Ciavatta faria para transformar em imagens um material que era essencialmente sonoro.

O resultado é irregular. Grande parte da história é contata pelo próprio Ademar Casé, em uma gravação feita “para a posteridade” no Museu da Imagem e Som do Rio de Janeiro em 1972. O diretor ilustra as histórias contadas por Casé com imagens antigas de Belo Jardim, cidade natal de Ademar, de Recife e do Rio de Janeiro. Também foram usadas imagens de arquivo da família, mostrando como o imigrante nordestino que chegou ao Rio de Janeiro sem um tostão se tornou um dos maiores nomes do rádio e, depois, da televisão. Um dos melhores momentos do documentário é uma entrevista com o cantor Braguinha e sua esposa, muito idosos mas bastante lúcidos e engraçados. Segundo o documentário, Ademar Casé foi o responsável pelo primeiro “jingle”, o primeiro contrato exclusivo com um artista, a primeira radionovela e diversas outras inovações.

Em seguida foi exibido o curta com o nome sugestivo de “Quem vai comer minha mulher?”, de Rodrigo Bittencourt. O curta é falado em inglês e se passa todo em um balcão de bar. Turley (Bernardo Melo Barreto, também roteirista do filme) está com um problema. Ele traiu a mulher com a melhor amiga dela, e agora ela quer lhe dar o troco com uma proposta bizarra: Turley tem que escolher um de seus amigos para transar com ela. É ai que entra Cauã Reymond. O diretor disse que o filme foi feito em inglês porque o roteirista o escreveu quando estava estudando cinema em Nova York. A explicação é boa, mas creio que o motivo tenha sido mesmo tentar emular o cinema de Quentin Tarantino, do design dos créditos de abertura aos diálogos cheios de trocadilhos. Teria sido melhor se o curta tivesse sido feito com película de cinema, e não com vídeo digital, que lhe dá uma imagem mais “novelesca” do que de um filme de Tarantino.

Malu de Bicicleta”, de Flávio Tambellini, fechou a noite. O longa-metragem foi escrito pelo escritor Marcelo Rubens Paiva, baseado no próprio livro. Paiva, presente ao evento assim como a equipe e elenco, disse que nunca se divertiu tanto em um set de filmagem quanto neste filme. Segundo ele, o roteiro era modificado continuamente pelos atores, e Tambellini é tão democrático que, por vezes, ele tinha vontade de “mandá-lo passear” e dirigir o filme ele mesmo. Sobre o elenco, Paiva disse ainda que eles não queriam estrelas “globais”, mas bons atores com quem eles convivem e tem experiência no teatro. O diretor, emocionado, dedicou a obra ao ator Marcos Cesano, que morreu há alguns meses.

O filme conta a história de Luis Mario (Marcelo Serrado), dono de uma boate em São Paulo e um tremendo mulherengo. Só que ele arruma tantas confusões com algumas mulheres que resolve passar umas férias no Rio de Janeiro, e é atropelado por uma jovem de bicicleta, Malu (Fernanda de Freitas), assim que chega à praia. É o que o cinema americano chama de “meet cute”, quando um casal se conhece em alguma situação inusitada, como trombando com as compras do supermercado. Malu é uma garota ideal, bonita, gostosa, boa de bola e que se apaixona rapidamente por Luis Mario. O problema é que ela também é muito popular e cheia de amigos homens que a abraçam e beijam em frente dele. Ela se muda para São Paulo com Luis, mas o monstro do ciúme e da desconfiança começam a assombrar a cabeça do rapaz. Por que ela vai tanto ao Rio de Janeiro? Por que ela não volta cedo do trabalho? Por que o celular dela toca sem parar?

Quem nunca fuçou na agenda ou celular da namorada ou namorado que atire a primeira pedra, mas Luis Mario vai ficando maluco aos poucos e pensa até em contratar um detetive para seguir a namorada. O filme começa devagar e, por um momento, passa a impressão que vai ser apenas mais uma série de clichês sobre homens e mulheres. Mas o roteiro inteligente de Marcelo Rubens Paiva e a honestidade do elenco fazem de “Malu de Bicicleta” uma boa “comédia romântica”, rótulo que foi descartado pelo próprio Paiva antes do início do filme. “Não sei que tipo de filme é este”, disse ele, “isso é cinema, as pessoas devem parar que querer dar rótulos".


terça-feira, 20 de julho de 2010

5º Dia: III Festival Paulínia de Cinema

Ontem foi outro dia de altos e baixos no Festival de Paulínia. A animação “Um Lugar Comum”, de Jonas Brandão, abriu a noite na categoria “curta regional”. O diretor de Sumaré fez o curta como projeto de conclusão de curso de Imagem e Som da Universidade de São Carlos, onde se formou. A animação é bonita e singela. Sem diálogos, mostra a passagem do tempo para alguns personagens que, sem querer, cruzam o caminho um do outro em um banco de praça. Os anos passando são representados pelo crescimento de uma árvore plantada no início por um garoto e uma garota. Vemos também como a pequena cidade no horizonte cresce e se modifica. O curta tem uma bela trilha sonora assinada por Duda Larson.

O documentário “Uma noite em 67” foi o ponto alto das exibições de ontem. Produção da Videofilmes, dos craques João Moreira Salles e seu irmão Walter Salles, o documentário mescla entrevistas atuais (gravadas em alta definição) com cenas da final do Festival de Música Brasileira da Record, de 1967. É o primeiro longa-metragem dos diretores Renato Terra e Ricardo Calil. Terra me contou que foi feito um grande trabalho de restauração das imagens, que começou com a escolha, na Record, das melhores fitas do arquivo da emissora. As imagens então passaram por um processo de correção frame a frame. O som também foi re-trabalhado e as músicas da época nunca soaram tão nítidas.

É muito interessante ver como era uma transmissão de televisão naquela época. Apresentadores como o grande Randal Juliano são vistos vestidos a caráter, com um microfone na mão e um cigarro na outra, entrevistando estrelas como Caetano Veloso, Gilberto Gil, Chico Buarque, Edu Lobo, Os Mutantes, Roberto Carlos e Marília Medalha, todos muito jovens, por volta dos 23 anos de idade. Estas entrevistas da época são intercaladas com entrevistas atuais com os artistas e a equipe de produção do festival. Paulinho Machado de Carvalho, por exemplo, revela que organizava os festivais da mesma forma que uma transmissão de luta livre. Ele escalava “papéis” aos músicos que, como em um drama, deveriam ser o “mocinho”, o “vilão”, a “mocinha”, e assim por diante. Chico Buarque, com seu smoking alugado e rosto bonito e comportado, tinha o papel do “mocinho”. O vilão do festival acabou sendo Sérgio Ricardo que, sob vaias quando tentava apresentar “Beto Bom de Bola”, acabou se enfurecendo, quebrando o violão e o atirando na platéia. Hoje ele diz que não se arrepende do que fez, e que um psicólogo diria que ele era como um animal acuado.

Roberto Carlos diz que as músicas que ele cantava nos festivais não eram escolhidas por ele, e que sua experiência como “crooner” em boate fez com que ele conseguisse cantar qualquer tipo de música. Ele ficou em 5º lugar com “Maria, Carnaval e Cinzas”.

O produtor musical Nelson Mota diz que a Record tinha um “monopólio dos musicais” no Brasil, com 90% dos músicos sob contrato. Ele conta também sobre uma passeata feita em 67 que era contra a guitarra elétrica, por representar o rock americano. Estavam presentes à passeata artistas como Elis Regina e Gilberto Gil. Caetano Veloso, em entrevista atual, diz que foi contra a passeata, que achava “fascista”, e que o uso da guitarra elétrica em sua famosa apresentação de “Alegria, Alegria”, no festival, foi uma decisão política. Gilberto Gil revelou que foi à passeata por causa de Elis Regina, e que não era contra a guitarra.

Ainda sobre Gilberto Gil, uma das revelações mais interessantes do documentário é dada por Paulinho Machado de Carvalho, que diz que Gil estava completamente bêbado e que não queria ir à final do festival. Carvalho teve que ir buscá-lo no hotel, lhe dar banho e trocá-lo para que ele fosse. Hoje, Gil revela que estava em pânico porque ele odiava ter que passar por uma “prova” e ser julgado diante dos outros.

“Uma noite em 67” é imperdível e nome certo para vencer o Festival de Paulínia na categoria documentário.



O curta nacional “1:21” interessa mais pelo modo como foi feito do que pelo filme em si. A diretora Adriana Câmara o produziu em seu apartamento, sem dinheiro e com a ajuda de amigos. Ele é todo captado em fotos estáticas, animadas na edição e acompanhadas apenas por efeitos sonoros. A idéia não é nova. O pernambucano Kleber Mendonça Filho produziu “Vinil Verde”, com a mesma técnica, em 2004.




Para finalizar a noite foi exibido o fraco “Dores e Amores”, de Ricardo Pinto e Silva. O diretor declarou que a idéia para o longa veio em um momento de solidão, quando estava trabalhando em Porto Alegre e decidiu fazer um filme sobre “sentimentos” e “amor”. Baseado no livro “Dores, Amores e Assemelhados”, de Cláudia Tajes e na peça “Intervalo”, de Dagomir Marquezi, o filme é uma série de clichês sobre os problemas de relacionamento de Julia (Kiara Sasso), uma executiva de uma agência de moda. Por longos 96 minutos, escutamos as reclamações de Julia sobre os homens. Atitudes e comportamentos que são aceitáveis nos adolescentes de “Derenrola”, apresentado na noite anterior, são apenas ridículos nos adultos de “Dores e Amores". Para piorar, o filme investe em uma edição “moderninha” cheia de efeitos de “picture in picture” e outras gracinhas digitais de alguém deslumbrado na ilha de edição. “Dores e Amores” é uma co-produção luso-brasileira, e estavam presentes ao festival a atriz portuguesa Sandra Cóias e o português Jorge Corrula.


segunda-feira, 19 de julho de 2010

4º Dia: III Festival Paulínia de Cinema

"Meu Avô e Eu" foi o curta regional exibido ontem no III Festival Paulínia de Cinema. Dirigido por Cauê Nunes, o filme trata da mudança no modo de encarar o trabalho entre as gerações. Um rapaz (Douglas Novais), enquanto aguarda para mais uma entrevista de emprego, fica se lembrando do tempo em que passava com o avô (Marcos Zuin). O trabalho, para o avô, era uma questão de honra, dignidade, além de uma forma de sustentar a família. Já o rapaz encara o trabalho como uma série de entrevistas de emprego em que os entrevistadores do RH estão mais preocupados em declamar conceitos empresariais como "target" e "marketing". A direção de fotografia é de Rodrigo Zanotto, que usou uma câmera fotográfica, a Canon 5D, para gravar o curta. O resultado é muito bom, visto que a câmera proporciona a chance de usar lentes fotográficas como as do cinema, o que resulta em melhor profundidade de campo e uso do foco.

Em seguida foi exibido o documentário "As Cartas Psicografadas por Chico Xavier", de Cristiana Grumbach. A diretora disse que não é espírita e que seu objetivo foi tentar entender o sentimento de uma família ao receber uma carta psicografada de um ente querido. Assim, o documentário é composto por uma série de entrevistas feitas principalmente com mães que perderam seus filhos de forma trágica, como acidentes de moto, carro ou mesmo avião. Do ponto de vista de um não-crente, todas as cartas são extremamente parecidas e escritas usando do mesmo estilo poético e prolixo, além de usar palavras iguais, citar muitos nomes e, no final, assinar com o nome inteiro do morto, o que sugere que foram todas escritas pela mesma pessoa. Para os pais e mães desesperados, que perderam a vontade de viver, revoltaram-se com Deus e não viam mais sentido na vida, as cartas representam uma espécie de renascimento. O documentário acaba sendo um estudo curioso sobre a necessidade de acreditar na vida após a morte e na importância dos filhos. Uma mãe explica de forma simples: "Você não pularia atrás do seu marido se ele resolvesse pular da janela. Mas se fosse seu filho, você se atiraria".
Como cinema, o documentário é repetitivo e um pouco desestruturado. As cartas são ouvidas na narração da própria diretora, enquanto vemos as páginas com a letra quase ilegível de Chico Xavier. Mas algumas decisões foram equivocadas. Por exemplo, para representar o mundo espiritual (talvez), a diretora mostra a cadeira onde estava sentado o entrevistado vazia, em cortes secos que acabaram gerando risos involuntários na platéia. Visualmente, é como se o entrevistado simplesmente desaparecesse no ar, o que causa um efeito mais cômico do que interessante.

Na categoria curta nacional foi exibido o simpático "Eu não quero voltar sozinho", de Daniel Ribeiro. Leonardo (Guilherme Lobo) é um adolescente cego que estuda em uma escola normal. Sua melhor amiga é Giovana (Tess Amorin), que lhe serve de guia e o leva para casa depois das aulas. O interesse de Giovana por Leonardo, aparentemente, é maior do que a simples amizade. A chegada de um aluno novo, Gabriel (Fábio Audi), acaba transformando a dupla em um trio, e Giovana fica enciumada por causa da aproximação entre Leonardo e Gabriel. Seria apenas amizade ou haveria algo a mais entre os dois garotos? A platéia presente em Paulínia aplaudiu muito o filme, principalmente pelo final ousado.

"Desenrola" de Rosana Svartman, foi uma boa surpresa. No início tem-se a impressão de que vamos ver um capítulo longo de Malhação; há uma escola de classe média no Rio de Janeiro, adolescentes "irados", trilha sonora ensurdecedora, atores e atrizes "globais", como Cláudia Ohana, e a participação de Pedro Bial como o professor de matemática não prometiam muito. Aos poucos, porém, a história da jovem Priscilla (Olívia Torres, uma graça) e seus colegas foram conquistando o público. Os dramas adolescentes apresentados são os de sempre; paqueras, ciúmes, foras e a eterna preocupação com a "primeira vez". Mas estes temas são apresentados de forma natural e engraçada. Priscilla é apaixonada por Rafa (Kayky Brito), o "gostosão" da praia, mas ela põe tudo a perder com ele ao revelar que é virgem. Isso lhe dá a idéia para um trabalho de estatística que seu grupo tem que fazer para o colégio. Quantas garotas ainda seriam virgens na escola? A pesquisa acaba gerando vários boatos sobre Priscilla, inclusive um video em que um garoto, Boca (Lucas Salles), diz que ela "faz de tudo" acaba indo parar no youtube. No início ela fica brava mas, depois do fora que levou de Rafa, quem sabe a fama de "galinha" não seja uma boa?
O roteiro, da própria diretora com Juliana Lins, é divertido e o filme acerta ao retratar os jovens de hoje com os mesmos dramas universais que seus pais passaram no "século passado". Há boas referências a coisas "antigas" como fitas K7 e Walkman, além de músicas tema dos anos 80, como "Don´t you forget about me", do Simple Minds. Sim, o filme é extremamente "global", comercial e, como já disse, chega perigosamente perto de ser um capítulo de Malhação em diversos momentos, mas a direção, roteiro e elenco conseguem se elevar acima disso, e "Desenrola" acaba resultando em um filme gostoso de assistir.


domingo, 18 de julho de 2010

3º Dia: III Festival Paulínia de Cinema

O III Festival Paulínia de Cinema teve ontem a exibição do ótimo "Cinco vezes favela, agora por nós mesmos". Também foram exibidos o curta regional "Nicolau e as árvores", o documentário "São Paulo Companhia de Dança" e o curta nacional "Estação".

"Nicolau e as árvores" foi dirigido por Lucas Hungria, que ganhou edital do II Festival de Cinema e Meio Ambiente de Guararema. A trama é simples e mostra o amor (ou obsessão) de um garoto pelas árvores. O filme é bem simples e tecnicamente pobre. Gravado em Guararema, em uma região verde e arborizada, o roteiro faria mais sentido, talvez, se Nicolau vivesse em uma "selva de pedra" como São Paulo.


"São Paulo Companhia de Dança" é um belo documentário dirigido por Evaldo Mocarzel. Vários bailarinos e bailarinas da companhia estavam presentes ao festival e subiram ao palco com o diretor e o editor do filme. Mocarzel disse que o documentário não tem entrevistas porque o cinema e a dança podem prescindir das palavras. Disse também que gosta muito de dança e que o filme é uma "celebração ao corpo, que é o instrumento de trabalho e a própria obra".

De fato, o corpo dos dançarinos é o foco do documentário. Usando câmeras digitais presas aos próprios bailarinos, os diretores de fotografia Alziro Barbosa, Fabiano Pierri e Milton Jesus colocam o espectador na dança. Acompanhamos os exaustivos ensaios dos dançarinos enquanto treinam a coreografia de um novo espetáculo. Músculos, pernas, troncos e principalmente mãos e pés são focalizados em detalhes. Estes últimos, envoltos em sapatilhas, apresentam as marcas do ofício, como bolhas dolorosas. O diretor chamou o trabalho dos dançarinos de "sacerdócio", mas as imagens dos ensaios lembram também a disciplina rígida de uma arte marcial.

A edição de Marcelo Moraes é primorosa. Mocarzel e Moraes me disseram que havia perto de 100 horas de material bruto para ser montado, e o editor declarou que foi o trabalho mais exaustivo que fez na vida. Mocarzel queria que os próprios gestos gerassem os cortes, e há uma série impressionante de sequências de ensaios intercaladas por pequenas jóias, como o corte que parte do grande espelho na sala de dança para os pequenos espelhos usados pelas bailarinas para se maquiarem.

O único porém é a longa duração do filme que, sem diálogos e saturado de imagens e música, acaba por ficar um pouco cansativo. Mas é uma bela obra, regada a música clássica e, claro, muita dança.

"Estação", de Márcia Faria, é muito bem feito tecnicamente, mas deixa a desejar. Conta a história de uma garota (Carol Abras), aspirante a atriz, que aparentemente está morando no Terminal Rodoviário do Tietê, em São Paulo, enquanto faz alguns trabalhos. Lembrando "Terminal", de Steven Spielberg, o filme mostra a garota trocando de roupa no banheiro, se limpando com lenços umedecidos e se alimentando de lanches. De vez em quando fala com a mãe pelo telefone, fingindo que mora em um apartamento. O curta termina como começa, sem nenhuma explicação ou resolução. "Estação" foi apresentado no Festival de Cannes este ano.

O longa-metragem "Cinco vezes favela, agora por nós mesmos" foi a grande estrela da noite. Os produtores Cacá Diegues e Renata de Almeida Magalhães, assim como vários membros do elenco e técnica, também subiram ao palco antes da exibição. Cacá Diegues foi um dos cinco diretores que, em 1962, lançou "Cinco Vezes Favela", um dos marcos do Cinema Novo. Diegues disse que tem muito orgulho deste novo filme, apesar dele não ter nenhuma imagem feita por ele. O projeto foi realizado através de oficinas nas comunidades do Rio de Janeiro e tanto roteiro quanto direção, além de grande parte do elenco, vieram dessas oficinas. O que mais chamou a atenção no resultado final é o bom humor e o clima otimista dos curtas. Com exceção de um deles, os episódios não seguem os estereótipos encontrados nos "filmes de favela", com seus traficantes, violência e mortes. Estes assuntos são abordados, mas de forma positiva.

Em "Fonte de renda", Maycon é um jovem esforçado que consegue entrar para a Faculdade de Direito. Ele tem dificuldades em pagar o alto custo dos livros e material didático, e sequer tem dinheiro para o ônibus. Um dia um colega de sala, sabendo que ele mora na favela, pede para que ele lhe traga drogas. A princípio Maycon se recusa, mas as dificuldades financeiras fazem com que ele comece a trazer pequenas quantidades de drogas para seus colegas "playboy" da sala. O tema, delicado, é tratado de forma respeitosa e o filme passa uma boa mensagem sem ser didático ou pedante.

"Arroz com feijão" mostra a luta de um garoto para comprar um frango para o jantar do pai, que não aguenta mais comer só arroz com feijão todos os dias. O episódio é muito engraçado e a interpretação dos atores infantis é ótima.

"Concerto para violino" investe mais no clichê do filme violento de favela. Três amigos de infância (um homem branco, um negro e uma mulher negra) enfrentam uma situação violenta iniciada a partir do roubo das armas de um batalhão do exército. Há certo exagero na caracterização tanto dos bandidos quanto da polícia, maniqueísmo que foi evitado nos outros episódios.

"Deixa voar" mostra a tradicional brincadeira de soltar pipas e como homens feitos, além das crianças, a levam a sério. Um pipa acaba caindo do outro lado do rio e um garoto é enviado, contra a vontade, para buscá-la. O que ele encontra acaba sendo uma boa surpresa.

"Acende a luz", o último episódio, mostra uma véspera de Natal no morro. A energia caiu e a comunidade está inquieta por causa dos preparativos para as festas. Um carro de técnicos da companhia elétrica diz que "vai buscar uma peça" e deixa os moradores na mão. Mas um técnico empenhado resolve subir a favela e tentar resolver o problema.

Os episódios foram dirigidos por Manaira Carneiro, Wagner Novais, Rodrigo Felha, Cacau Amaral, Luciano Vidigal, Cadu Barcellos e Luciana Bezerra, com Direção de Fotografia de Alexandre Ramos e Edição de Quito Ribeiro.


sábado, 17 de julho de 2010

2º Dia - III Festival Paulínia de Cinema

Sexta-feira, 16 de julho, começou a fase competitiva do III Festival Paulínia de Cinema. Foram apresentados dois curtas metragens (um regional e outro nacional) e dois longa metragens (documentário e ficção).
O curta regional da noite foi "Só não tem quem não quer", de Hidalgo Romero. Para quem é da região, foi interessante ver o bairro de Barão Geraldo, em Campinas, retratato na tela gigante do Theatro Municipal de Paulínia. Romero participa de um grupo de produção audiovisual chamado "Laboratório Cisco", interessante proposta de produção de filmes da cidade de Campinas. "Só não tem quem não quer" trata de um dia na vida de Anderson, um homem comum que, constantemente bombardeado por peças publicitárias e tentado pelos produtos que vê nas vitrines dos shoppings, acaba perdendo o controle. A produção é bem cuidada, com boa fotografia e edição. O final em aberto deixa um pouco a desejar.

Já o curta nacional apresentado foi uma pequena obra-prima chamada "Tempestade". Dirigido por César Cabral, o curta foi produzido usando a técnica de animação em "stop motion", ou animação de bonecos. Cabral estava presente ao festival e disse que o cronograma foi apertado, com o filme sendo feito em apenas quatro meses. A história, sem diálogos, mostra a luta de um marinheiro contra um mar revolto, tentando levar seu pequeno barco até onde está sua amada. A fotografia é cheia de sombras fortes, e o filme tem uma grande carga emocional auxiliada pelo uso do Concerto Número 1 de Philip Glass, que sabe como ninguém criar um clima de obsessão. César Cabral é também o diretor do premiado "Dossiê Rê Bordosa", falso documentário em stop motion sobre a polêmica personagem de Angeli. "Tempestade" poderia, facilmente, ganhar um Oscar de Melhor Curta Metragem Animado.


"Leite e Ferro" é um documentário de Cláudia Priscilla, que mostra a vida de mães presidiárias do CAHMP, Centro de Atendimento Hospitalar à Mulher Presa. As mães tem direito a ficar com seus bebês até que completem quatro meses, para amamentá-los. A câmera na mão acompanha estas mulheres que, de bebê quase sempre no colo, conversam sobre os mais diferentes assuntos.

Suas histórias geralmente seguem uma sequência que começa com abandono na infância, passa por fome, o início de pequenos furtos e uma escalada no mundo do crime, com uso e tráfico de drogas pesadas. Dentro da prisão, o "vício" é outro: a Bíblia. A mesma mulher que em um plano está falando sobre como quase teve uma overdose ao tentar engolir umas pedras de crack, no plano seguinte está "orando", aos berros, ao "Senhor Jesus".
Há histórias que, de tão bizarras, causaram gargalhadas involuntárias na platéia. Uma mãe, por exemplo, contou como conseguiu achar a veia da filha desidratada, em um hospital, enquanto nenhuma das enfermeiras tinham conseguido. Ela tinha experiência de tanto usar drogas. Outra mãe, com rosto inocente e com o bebê ao lado, conta porque o ex-marido "não está mais vivo". Ele passou AIDS para ela enquanto estava grávida. Ela esperou ter o bebê antes de matá-lo.
Elas falam também de sexo, traição (várias dizem que preferem trair antes mesmo de saber se estão sendo traídas pelo companheiro) e sobre a dor de imaginar que terão que se separar dos bebês quando acabar o prazo de quatro meses. O documentário, que é muito bom, teria sido melhor se tivesse presenciado (ou mesmo terminado) com uma cena destas. A diretora Cláudia Priscilla, presente ao festival, disse que quis fazer o filme depois de ter sido mãe, e que quis ver como a maternidade pode acontecer em uma situação limite como o cárcere.

E foi então que o festival exibiu seu primeiro mico, o "longa-metragem astrológico" As Doze Estrelas. O filme é tão cheio de clichês e absurdo que o público não sabia se estava diante de uma comédia maluca, rindo nervosamente.
A trama, inacreditavelmente ruim, conta a história de Herculano (Leonardo Brício), um astrólogo que é contratado por uma emissora de TV para encontrar as 12 atrizes ideais para uma novela que, claro, se chama "As Doze Estrelas". Cada atriz é de um signo, o que rende cenas melancólicas de mulheres bonitas declamando os mais variados clichês sobre como é ser de Virgem, Touro, Peixes e assim por diante. E não é só isso. Paulo Betti é um "cobrador de almas", o Destino em pessoa, vestido de preto e também declamando clichês, que aparece a Herculano e diz que ele tem uma chance de salvar sua vida com aquela novela.
A série de "candidatas a atriz" conta com lindas mulheres que, sem qualquer motivo, dão ao filme a chance de mostrá-las nuas ou então em uma cena de sexo bizarra entre Herculano e a atriz do signo de Touro, em um labirinto grego dentro da casa da atriz. Touro...Minotauro...entendeu, pobre espectador? Mylla Christie, de gêmeos, é uma mulher tão dupla que até os carteiros que vão lhe entregar telegramas são gêmeos. Há uma cena pateticamente inspirada em "Se eu fosse você", em que Herculano troca de corpo com a bela Carla Regina, o que também serve de desculpa para que ela saia do chuveiro e fique longamente se contemplando no espelho, completamente nua.
Rodado em Paulínia, o filme usa os próprios estúdios da cidade para se passar pela fictícia emissora de TV (que, estranhamente, não tem uma câmera sequer). Assim, quando Herculano entra na emissora, o público de Paulínia via o reflexo, na janela, da estátua da "Menina de Ouro" que ficava em uma rotatória da cidade (e, por obra de Paulo Betti, ou melhor, do Destino, caiu em um vendaval ano passado). O filme tem a direção de Luiz Alberto Pereira que, com toda a equipe e elenco, subiu ao palco antes da exibição do filme.

sexta-feira, 16 de julho de 2010

III Festival Paulínia de Cinema

Começou ontem a terceira edição do Festival Paulínia de Cinema, que vai até o dia 22 de julho com a exibição de curtas metragens regionais e nacionais, documentários e filmes de longa metragem.

Ontem a festa era só para convidados e o festival prestou homenagem ao cineasta Hector Babenco, que estava presente com a esposa Bárbara Paz. A cerimônia de abertura foi apresentada pelos atores Lázaro Ramos e Fernanda Torres que, bem humorados, falaram sobre o evento, agradeceram aos presentes e homenagearam Babenco que, emocionado, subiu ao palco sob muitos aplausos.

Babenco, que é argentino mas vive no Brasil desde os 19 anos de idade, falou sobre as diferenças entre se fazer cinema hoje e no seu tempo. Ele disse que fazia cinema na “era paleolítica”, e que era muito mais difícil produzir imagens com o equipamento pesado de sua época. Como exemplo, disse que para o longo plano-sequência que inicia “O Beijo da Mulher Aranha”, o Diretor de Fotografia Rodolfo Sánchez teve que ensaiar por dois dias os movimentos da câmera.

Este filme recebeu quatro indicações ao Oscar de 1986, feito que só seria repetido por “Cidade de Deus”, de Fernando Meireles, em 2004. William Hurt levou o Oscar de Melhor Ator interpretando um homossexual que divide a cela com Raul Julia. “O Beijo da Mulher Aranha” foi exibido depois que Hector Babenco recebeu o prêmio “Menina de Ouro” do prefeito de Paulínia. Babenco declarou que fez o filme em inglês “para tentar pagar umas contas”, achando que receberia mais bilheteria. Ainda segundo ele, isso não aconteceu porque eles foram “roubados olimpicamente” pela distribuidora.


domingo, 11 de julho de 2010

In Cold Blood - O livro e suas adaptações cinematográficas

O livro

"In Cold Blood - A True Account of a Multiple Murder and Its Consequences" escrito por Truman Capote, foi publicado pela primeira vez na revista The New Yorker, ao longo de quatro edições, em 1965, e em seguida na forma de livro. Apesar de não ter sido o primeiro do gênero "jornalismo literário", é certamente um marco. Exemplos anteriores podem ser vistos nos trabalhos do inglês Daniel Dafoe ou do brasileiro Euclides da Cunha (em "Os Sertões"). Capote, que tinha um ego tão grande quanto seu talento, no entanto, gostava de dizer que havia criado o gênero do "livro de não-ficção". Controvérsias à parte, o livro é realmente brilhante.

Em 15 de novembro de 1959, dois ladrões comuns, Richard Hickcock e Perry Smith entraram na casa de uma tradicional família metodista em Holcomb, Kansas, atrás de dinheiro. Hickcock achava que havia um cofre com 10 mil dólares no escritório de Herbert Clutter, o dono da casa, por causa de informações passadas por um ex-companheiro de cela, Floyd Wells. Quando Hickock e Smith descobriram que não havia dinheiro na casa, eles amarraram Clutter, sua esposa, seu filho e sua filha e, a sangue frio, deram um tiro de espingarda na cabeça de cada um. O dono da casa, além do tiro, teve a garganta cortada por Smith que, em sua confissão, depois, diria que achava que Clutter era um bom homem, até o momento em que cortou sua garganta.

Truman Capote leu uma nota a respeito do caso em 16 de novembro, no The New York Times, e foi investigar o caso. O que começou como um estudo sobre como o crime afetaria a vida de uma cidade pequena se transformou em um projeto que consumiu quase seis anos da vida de Capote e o levou a milhares de páginas de pesquisa e entrevistar centenas de pessoas, inclusive os dois assassinos, de quem se tornou confidente. O livro é dividido em quatro capítulos: 1- The Last to see Them Alive (Os últimos a vê-los com vida), 2- Persons Unknown (Pessoas desconhecidas), 3 - Answer (A Resposta) e 4 - The Corner (A forca). Usando de uma prosa fluente e detalhada, Capote começa por descrever a pequena vila de Holcomb, parte da cidade de Garden City, do distrito de Finney. Área agrícola, de produção de trigo e criação de gado, a população do povoado é formada pelo típico "caipira americano", religioso (de várias congregações protestantes), tradicional, com grandes famílias. Os Clutter são descritos de forma a torná-los humanos para o leitor e nos acostumar a seu modo de vida e rotina. Capote não os descreve simplesmente, mas recria diálogos e até os pensamentos das vítimas em seu último dia de vida. Há certa idealização na forma como os Clutter são descritos como exemplos de bons americanos e cidadãos ativos da comunidade. O patriarca Herb é daqueles americanos que se fizeram do nada, tranformando uma área de Kansas em uma terra fértil em que empregava até 18 pessoas com bons salários. A filha Nancy era aluna exemplar que ajudava as companheiras de escola com aulas de música e culinária. O filho Kennyon, de 15 anos, era alto como o pai, também aluno exemplar e com boas habilidades manuais. A mãe é mostrada como uma mulher depressiva, com problemas mentais que talvez tivessem origem física, devido a um problema na coluna, que estava agendada para ser operada. A típica família WASP (branca, anglo-saxã e protestante) americana.

Os assassinos, Hickock e Smith, vieram do outro espectro desta sociedade. Hickock também era o típico caipira, com 28 anos e o ensino médio, mas desiludido com o "sonho americano". Casou-se aos 16 anos, teve três filhos, se divorciou, casou-se de novo e foi preso por uma série de pequenos furtos e por passar cheques sem fundo. Perry Smith é um caso mais complicado. Descendente de índios, o pai e a mãe tinham um show de rodeio e levavam a família em uma vida nômade pelos Estados Unidos. Eles se separaram, a mãe levou os filhos para São Francisco, teve casos com vários homens e literalmente bebeu até morrer. O irmão mais velho de Perry matou a esposa por ciúmes e se matou em seguida. Uma irmã também se matou se jogando da janela de um prédio em São Francisco. A irmã sobrevivente foi a única a ter uma vida "normal", se casando e tentando se manter o mais longe possível do irmão mais novo. Perry Smith viajou com o pai para o Alaska, entrou para o exército, esteve no Japão e na Guerra da Coréia, antes de voltar aos Estados Unidos. Ficou quase aleijado em um acidente de moto e foi parar na prisão por roubo.

É impressionante o modo como Capote narra este encontro violento entre a vida ideal dos Clutter e estes dois párias da sociedade americana. Interessante também como ele consegue manter o suspense da narrativa, mesmo que saibamos, desde o princípio, o destino dos Clutter e quem os matou. Ele mantém a violenta descrição da noite do crime mais para o final do livro, de modo que o leitor fica ansioso para saber como crime foi cometido. O próprio Capote, curiosamente, é "invisível" durante o livro. Sabemos que ele estava presente a várias das cenas descritas e que foi testemunha dos diálogos, extremamente realistas, que "escutamos". Apesar do título de "história real", o livro gerou muita controvérsia sobre sua veracidade após a publicação. Este artigo da internet questiona até que ponto Capote não romanceou certas situações, misturou personagens ou mudou a cronologia para ajudar na narrativa. Por vezes, é verdade, é como se Capote estivesse dentro da cabeça dos personagens. Há também um tom homossexual subentendido na relação de Hickock e Smith (principalmente neste último), que não é explicitado pelo autor. De qualquer forma, tudo termina em 1965 quando, também de forma violenta, os dois condenados são enforcados na penitenciária de Kansas. Um deles, Hickock, levou vinte minutos para ser considerado morto pelo médico legista.

Os filmes

"In Cold Blood" ganhou uma versão cinematográfica em 1967, um ano após a publicação do livro. Dirigido por Richard Brooks, em preto e branco (com fotografia do mestre Conrad Hall), foi indicado a vários Oscars. Os atores Robert Blake e Scott Wilson interpretam Perry Smith e Dick Hickcock, e o filme é bastante fiel ao livro, com um estilo de câmera por vezes televisivo, com farto uso de lentes zoom e montagem criativa, ligando um plano ao próximo, por similaridade. A cena final, da execução de Perrry, seguida do título "In cold blood", letras brancas em fundo preto, dá a impressão de que o enforcamento, assim como os assassinatos, também foi feito "a sangue frio", em clara crítica à pena de morte. O filme está fora de catálogo no Brasil, mas pode ser encontrado para baixar pela internet.


Já "Capote", de 2005, dirigido por Bennet Miller, tira o foco dos assassinatos e o coloca na figura controversa do próprio escritor. Truman Capote já era uma figura conhecida por seus livros e seu envolvimento com Hollywood (ele havia escrito o roteiro de "O Diabo Riu por Último", de John Huston, com Humphrey Bogart, em 1953, e teve vários livros transformados em filme) quando foi investigar o caso Clutter. Homossexual, excêntrico, ele era um peixe fora d´água no povoado de Holcomb, onde foi pesquisar os crimes com sua amiga, a escritora Harper Lee (interpretada por Catherine Keener). Capote foi interpretado fielmente por Philip Seymour Hoffman, que se transformou para encarnar o escritor e foi premiado com o Oscar de Melhor Ator pelo trabalho. O filme mostra os bastidores da criação do livro e o envolvimento, por vezes perigoso, de Capote com os acontecimentos. Ele fica fascinado principalmente pela figura trágica de Perry Smith (Clifton Collins Jr), com quem se identifica. A situação se complica porque, por um lado, Capote quer ajudar Perry Smith a arrumar novos advogados e tentar reverter sua sentença. Por outro lado, ele não consegue terminar seu livro enquanto o Estado do Kansas não enforcar os condenados. A cada vez que a execução é adiada pela apelação dos advogados, Capote fica cada vez mais desesperado. Lendo o livro, é possível sentir a ansiedade do escritor no último capitulo, que lida com os longos cinco anos em que Hickock e Smith ficaram no corredor da morte. Capote, tão detalhado e descritivo durante o decorrer do livro, neste capítulo tem que recorrer a frases como "Dois anos se passaram", e assim por diante. No filme, é com sentimentos mistos que Capote finalmente assiste à execução de Perry e Hickock. A sensação de não ter feito mais por Perry assombra sua consciência. Mas há o alívio de poder finalmente terminar o livro e tentar esquecer todo o caso.
Truman Capote, o verdadeiro, morreu em 1984, aos 60 anos, de problemas no fígado.

Livro lido da edição da Penguin Classics, original em inglês, de 336 páginas. No Brasil, o livro "A Sangue Frio" é publicado pela Companhia das Letras, com tradução de Sérgio Flaksman, 440 páginas, e pode ser encontrado nas principais livrarias.


sábado, 10 de julho de 2010

Não, minha filha, você não irá dançar

Há duas fábulas contadas por personagens de "Não, minha filha, você não irá dançar" que lidam com mulheres que venderam a alma ao diabo. Uma explica o título original, e fala sobre uma mulher que não queria se casar e só gostava de dançar. Ela promete ao pai que se casaria com o homem que conseguisse dançar com ela por 12 horas seguidas. Vários pretendentes tentaram e morreram no processo, até que o próprio diabo apareceu para dançar. Na outra fábula, uma mulher vende a filha ao diabo por 14 moedas de ouro. Só que quando ela vai pegar as moedas, elas estavam tão quentes (por terem vindo do Inferno), que ela queimou as mãos e não pode usá-las. No novo filme de Christophe Honoré (exibido na Mostra Internacional de São Paulo em 2009 e em cartaz em Campinas no Cine Topázio), Chiara Mastroianni é Lena, mãe de dois filhos que um dia decide ser "livre", abandona o marido e foge com as crianças. Mas, como mostra uma cena no início do filme, ela não tem condições sequer de cuidar de um filhote de passarinho, quanto mais de um casal de crianças.

O filme é passado em uma daquelas charmosas casas de campo francesas, onde a família de Lena se reúne para um final de semana. Lá estão seu pai e mãe (Marie-Christine Barrault e Fred Ulysse), apaixonados depois de décadas de intimidade (e protagonistas de rara cena de sexo entre idosos) mas, como pais em todo mundo, um pouco intrometidos na vida dos filhos. Na casa também estão a irmã de Lena, Frédérique (Marina Foïs) que está grávida, e Gulven (Julien Honoré), o irmão "palhaço" de Lena, com a namorada. Chamar a família de Lena de "complicada" é redundante, embora, como diz a música do Titãs, as famílias nunca perdem essa mania, não importa a cultura a qual pertencem. Todos têm sugestões e planos para Lena. A mãe, em uma idéia ousada e que deixa Lena brava, também convida o ex-marido dela, Nigel (Jean-Marc Barr) para o final de semana, para ver os filhos.

A bela direção de fotografia e a interpretação dos atores é ótima, mas o roteiro (do próprio Honoré), extremamente ácido a sarcástico na relação entre os personagens, tem problemas. Lena é uma personagem que, apesar de bastante humana, está longe de ser simpática. Ela é paranóica, mimada e egoísta, e mesmo o amor que demonstra pelos filhos parece ser mais uma questão de superproteção do que algo verdadeiro. Honoré peca ao não focar a trama em Lena, deixando algumas questões em aberto ou criando dramas que não se desenvolvem. Por exemplo, no início do filme sabe-se que o pai de Lena está com um "problema neurológico" incurável, e em uma cena em Roma ele comenta o fato com a esposa. Mas nada mais se fala no assunto depois. A irmã Frédérique, a mais parecida com a mãe, começa o filme grávida e cheia de problemas psicológicos. O marido suspeita que ela o tenha traído. Na segunda parte do filme nada é dito sobre o filho que ela supostamente teve (ela não está mais grávida) e apesar de algumas conversas sobre um possível divórcio, nada realmente acontece. Há algumas soluções de roteiro muito fáceis, como uma explicação ao espectador dada pelo pai de Lena, no início do filme, basicamente falando para a câmera.

Chiara Mastroianni, que carrega uma herança incrivelmente cinematográfica (é filha de Catherine Deneuve e Marcello Mastroianni) interpreta Lena muito bem. Sua personagem é vítima da complicada mistura entre o desejo de liberdade com a falta de responsabilidade de alguém que, no fundo, sempre teve tudo na vida.