A cultura japonesa é, no fundo, uma cultura da morte. Uma celebração da efemeridade da vida e da passagem inexorável do tempo. O mesmo ritual estilizado com que se prepara um vaso de flores é o empregado pelo samurai antes de cortar a própria barriga. É nessa relação entre a vida e a morte que se apóia o filme alemão "Hanami - Cerejeiras em Flor", da escritora Doris Dorrie. Hanami é um festival que ocorre no Japão durante a florada das cerejeiras. As flores surgem apenas por alguns dias, colorindo a cidade em tons de vermelho e rosa, e depois desaparecem. Novamente, uma celebração da vida e da morte.
Trudi (Hannelore Elsner) recebe a notícia de que seu marido está com uma doença terminal. Os médicos sugerem que ela vá viajar com ele para aproveitar seus últimos momentos. O marido, Rudi (Elmar Wepper), é um homem sem muita imaginação, que todos os dias faz o mesmo trajeto até o trabalho, onde está há décadas, e volta para casa. Trudi, com seu jeito manso e maternal, consegue convencê-lo a ir até Berlin visitar os filhos crescidos, mas não lhe conta sobre a doença. Em Berlin, os filhos mal conseguem esconder o fato de que são pessoas ocupadas e que não têm tempo para dar atenção aos pais. Há ainda outro filho, Karl, que é o "preferido da mamãe" e que mora em Tóquio. Tanto na casa de Trudi e Rudi quanto na casa dos filhos vemos, nas paredes, gravuras japonesas e lembranças enviadas por Karl. A própria Trudi, na verdade, gostaria de ter sido uma dançarina de Butoh, uma dança japonesa, mas deixou tudo em nome da família. Há uma bela cena passada em um teatro alemão em que o dançarino Tadashi Endo se apresenta e Trudi, na platéia, mal contém as lágrimas. O velho casal então vai à praia e, inesperada e ironicamente, Trudi morre durante a noite, dormindo, deixando Rudi sozinho e sem saber que, ele mesmo, está fatalmente doente.
O filme tem um ritmo extremamente lento e, a bem da verdade, ganharia com uma edição mais enxuta. Com a morte de Trudi (a excelente Hannelore Elsner), praticamente começa outro filme, ainda mais longo, mostrando a viagem de Rudi ao Japão, onde encontra o filho Karl e fica tentando, em vão, entender a morte (e a vida) da esposa. Tóquio é, como todo Japão, um grande paradoxo, um monstro de concreto onde se escondem belos jardins e o contato com a natureza. Rudi faz amizade com uma jovem dançarina (Aya Irizuki) e, com ela, parte para tentar ver o lendário Monte Fuji e tentar se "reencontrar" com o espírito da esposa. Não é um filme fácil, fazendo parte daquela categoria fugidia dos "filmes de arte". A interpretação do elenco é impecável e o filme é um retrato interessante, para os espectadores brasileiros, da vida no primeiro mundo. Por todo o trajeto de Trudi, Rudi e família, somos testemunhas do eficiente sistema de transporte alemão e japonês, da presença marcante da Arte, da eficiência das instituições. Por outro lado, percebemos a frieza das pessoas, principalmente dos filhos em relação aos pais, considerados um estorvo depois de velhos. Bom filme atrapalhado pela longa duração, com cenas repetitivas que poderiam ter sido cortadas facilmente.
2 comentários:
Opnião compartilhada com vc, já assistiu 'a partida'? me faz acreditar na cultura da morte... bjos
Tudo bom, Carol? Vi "A Partida" sim, foi o vencedor do Oscar de Melhor Filme Estrangeiro. De fato, a morte está explícita naquele filme. Mas ela está presente de forma mais sutil em vários aspectos da cutura e religiões japonesas. Mas não tem a mesma conotação "negativa" que a morte tem no ocidente. É mais parte da vida.
Bjos.
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