sexta-feira, 19 de março de 2010

Um Sonho Possível

O Oscar é um prêmio contraditório. Um filme "pequeno" e independente como "Guerra ao Terror" derrotou a maior bilheteria de todos os tempos, "Avatar". Ao mesmo tempo, um filme ruim como "Um Sonho Possível", improvável sucesso de Sandra Bullock, foi indicado ao Oscar de Melhor Filme, e a própria Bullock foi considerada a Melhor Atriz do ano (sendo que, no dia anterior ao Oscar, ela havia sido "premiada" como Pior Atriz no "Framboesa de Ouro").

"Um Sonho Possível" tem todas as características de um "feel good movie", em que valores tradicionais americanos como perseverança, família e culto à vitória são defendidos. Uma das principais características da História americana, lamentavelmente, é o racismo, e fica difícil assistir a este filme sem imaginar que ele prega exatamente o oposto do que defende. Sandra Bullock é Leigh Anne Tuhoy, uma mulher rica, cristã e poderosa do sul dos Estados Unidos. Sua família de comercial de televisão é composta por um marido bondoso, uma filha estudiosa e um garoto "esperto". Uma noite fria Leigh Anne vê um jovem negro andando na calçada e pede para o marido parar o carro. Ele é "Big Mike" (Quinton Aaron), um rapaz pobre que conseguiu uma bolsa de estudos para frequentar a mesma escola católica que os filhos de Leigh. Mike é o típico "negro inofensivo" dos filmes (racistas) americanos. Ele é alto e forte, mas tem o coração de uma criança. E, claro, precisa ser salvo por um branco para ser alguém na vida. Sem qualquer objeção do marido ou dos filhos, Leigh Anne convida o rapaz para passar a noite na casa deles, e ele vai ficando. Sem dúvida o filme quer passar valores como solidariedade e amor ao próximo, mas a sensação que o ele passa é a de que Big Mike não passa de um cachorrinho perdido, levado para cima e para baixo pela dona, que o leva para comprar roupas e separa um quarto para ele na casa.

A não ser por alguns comentários das companheiras "dondocas" de Leigh Anne, a transformação instantânea de Big Mike em filho adotivo da família Tuhoy acontece na maior tranquilidade. Não há problemas de adaptação de nenhum dos dois lados, nenhum sinal de revolta por parte de Mike ou de racismo por parte dos Tuhoy. Na escola, apesar de Mike nunca ter tirado notas boas, uma professora encontra, inacreditavelmente, um texto dele no lixo, em que descreve, em prosa e gramática perfeitas, como ele se sente perdido em meio aos "muros brancos" que o cercam. Escrito e dirigido por John Lee Hancock, o filme é "baseado em fatos reais", o que não impede que ele seja completamente inverossímil. Big Mike é adotado legalmente pela família e começa a praticar futebol americano, devido à sua força e tamanho. Mas, novamente, ele é visto como se fosse um portador de necessidades especiais, incapaz de entender o jogo ou o que o técnico quer dele. O que não o impede, milagrosamente, de se tornar a grande atração do time e futura promessa entre os profissionais.

Por tudo isso, "Um Sonho Possível" é formuláico, retrógrado e mau cinema. A interpretação de Bullock não tem nada de excepcional e sua vitória no último Oscar é tão inacreditável quanto o roteiro deste filme.


4 comentários:

Anônimo disse...

Oi, meu querido amigo cinéfilo! :)

Passei aqui pra ler o último post que tinha passado batido, e para contar que ontem fui ao cinema e assisti "O ammor acontece" (Love Happens). Super sessão da tarde! Água com açúcar total! :P

Bjs bjs!

João Solimeo disse...

O pior é que o título original é "Love Happens" mesmo, assumidamente Sessão da Tarde!

bjos

Thaís Inocêncio disse...

Oi Joãozinho!
Tô atrasada, mas precisava comentar sobre esse filme.
Devo dizer que ameeei e chorei mais do que quando corto cebola!
É bonito, vai... e é baseado em fatos reais, oras. Isso aconteceu de verdade, mesmo que não narrada da forma exatada como as coisas ocorreram.
E eu gosto da Sandra Bullock tbm!
Mas enfim, eu não entendo de cinema como você, apenas aprecio a arte. ;*

PS: Não tem como eu não gostar de filmes baseados em histórias reais. É tão legal imaginar que tal história deu um filme. Meu preferido é "Homens de honra".

BEEEIJO.

João Solimeo disse...

Tudo bom, Thaís? Então, acho que há várias formas de se contar uma história, seja ela baseada em fatos reais ou não. Na minha opinião (e isso não tem muito a ver com "entender de cinema" ou não), o modo como esta história em particular foi feita foi racista. Tratam o cara como se ele fosse o Forest Gump, hehe. Mas o filme fez bastante sucesso mesmo, principalmente nos Estados Unidos, e rendeu o Oscar para a Sandra Bullock. Achei injusto, qualquer outra das concorrentes, principalmente a de "Preciosa", seria mais adequado, em minha opinião.

Bjos e visite sempre.