"Nenhum homem é uma ilha", diz o ditado. Mas quem estuda um pouco de psicologia sabe que, na verdade, somos todos ilhas. Não há nada mais individual do que o modo como cada um vê e interpreta o mundo ao seu redor. O que é a realidade se não o modo como percebemos e interpretamos as coisas?
O novo filme de Martin Scorsese se passa integralmente em uma ilha, Shutter Island, no leste dos Estados Unidos. É uma ilha sanatório, para onde são enviados os pacientes mais perigosos e violentos. A trama também se passa em outra "ilha", nas memórias do personagem principal, Teddy Daniels (Leonardo DiCaprio, em mais uma parceria com Scorsese), traumatizado pela morte de sua esposa em um incêndio e pelas lembranças terríveis de quando libertou um campo de concentração nazista, na II Guerra Mundial. Teddy é um agente federal que é enviado à Shutter Island com seu parceiro Chuck (o sempre competente Mark Ruffalo) investigar o misterioso desaparecimento de uma paciente. Eles são recebidos pelo doutor Cawley (Ben Kingsley), que tem teorias próprias quanto ao modo de tratar os pacientes.
"Ilha do Medo" é um filme de suspense com toques de terror, e vai se tornando cada vez mais sinistro conforme a trama avança. Nem sempre o roteiro funciona, mas a competência impecável de Scorsese na direção e a boa interpretação do sólido elenco (que conta ainda com nomes como Max von Sidow e Emily Mortimer) contornam eventuais problemas. Scorsese é genial em mostrar que nem tudo é o que parece com pequenos detalhes, como a rápida cena em que um personagem "toma água" com um copo inexistente, ou um farol de navegação que não parece estar duas vezes no mesmo lugar. DiCaprio pode não ser um substituto à altura de Robert DeNiro (o antigo colaborador habitual de Scorsese), mas é bom ator e, aos poucos, vai passando ao espectador a sensação de que há algo errado com seu personagem. Ou será que o problema não é com ele? Será que Teddy é apenas paranóico ou há realmente um plano sombrio por trás do Dr. Cawley e os médicos da ilha? Ou, como diz uma piada de humor negro, "meus remédios para a paranóia estão tramando contra mim". Há, claro, ecos de Hitchcock em vários momentos do filme, de "Um Corpo que Cai" à "Psicose". E alguns toques de "O Iluminado", de Stanley Kubrick.
Dependendo de como se encara a trama (e o que é real ou não), o final pode ser tanto absurdo quanto aceitável. Não é um filme perfeito, e Scorsese já teve dias melhores. Mas, enquanto se desenrola, "Ilha do Medo" cumpre seu papel de intrigar e assustar o espectador.
PS: A trilha de "Ilha do Medo" foi organizada por Robbie Robertson. O tema principal do filme é a Sinfonia número 3 de Penderecki, que pode ser ouvida aqui:
7 comentários:
Parece bacana. Essa semana eu vi Taxi Driver. Gosto do Scorcese, mas a preguiça de ir ao cine me mata.
Abraço
Taxi Driver é uma das obras primas de Scorsese (diria que Touro Indomável e Os Bons Companheiros são as outras duas). Ilha do Medo é dos melhores Scorseses que ele fez nos últimos anos, e desconfio que o filme fique mais interessante da segunda vez.
Abraço.
ps: preguiça? hehe. Olha, tenho visto uns filmes no DVD e micro e não tem comparação com a telona e o ambiente do cinema.
'' Ilha do medo'' pode ser comparado a ''Clube da luta''. Na primeira vez que você assisti, tudo é chocante e surpreendente. A partir da segunda, cada detalhe percebido é um orgasmo e o filme se torna excelente e gostoso de assistir. (Não relacionem os orgamos a Leo Dicaprio e Brad Pitt. haha)
Acabei de ver e gostei, apesar de achar que poderia ser menor um pouco. Scorcese, é Scorcese. Leo de Caprio está melhorando a cada filme. Acho que em 2 anos ele pode levar até o Oscar.
Paulo, não havia pensado em "Clube da Luta", mas há algumas coisas em comum sim. E dizem que originalmente Ilha do Medo seria dirigido pelo David Fincher e teria Brad Pitt no lugar do Dicaprio e Mark Wahlberg no lugar do Mark Ruffalo.
Ricardo, sim, o filme poderia ser um pouco mais curto, talvez. DiCaprio é bom ator, não sei se suficientemente para o Oscar ainda. Falando em Oscar, Ilha do Medo foi completamente ignorado. Ele poderia facilmente ter sido indicado às categorias de montagem, fotografia e coajuvante para Ruffalo.
Creio que o filme foi lançado este ano e não estava na lista das indicações do Oscar 2010, que ser refere apenas aos filmes de 2009. Então acho que ele pode ganhar alguma coisa no Oscar 2011, mas como foi lançado agora no comecinho do ano, vai perder muita força até lá.
Então, infelizmente não é o que aconteceu. A Paramount preferiu investir na campanha de filmes mais leves para o Oscar e deixou "Ilha do Medo" de lado.
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