Curioso este momento de transição pelo qual passamos. Os oito anos de governo Bush deixaram um gosto amargo na política internacional dos EUA, única potência do mundo e mais xenofóbico e assustador do que nunca. A chegada de Barack Obama à Casa Branca vem carregada de esperança para o futuro, mas ainda há muita desconfiança entre os países do mundo e o fantasma do 11 de setembro ainda permanece na memória recente das pessoas. Com Bush ou sem, o fato é que há uma enorme desigualdade social no Brasil e no mundo, o que força cada vez mais as pessoas a fugirem de seus países em busca de uma vida melhor em outro lugar. E Nova York ainda mantém o posto não oficial de capital do mundo, com a Estátua da Liberdade dando boas vindas aos imigrantes famintos, desde que eles consigam fugir da imigração americana. É neste cenário que se passa "O Visitante", produção sensível escrita e dirigida por Thomas McCarthy.
Walter Vale (Richard Jenkins, perfeito) é um professor universitário cuja vida está estagnada. Ele repete a mesma aula há anos sem muito interesse tanto de sua parte quanto de seus alunos. Tenta sem sucesso, nem muito esforço, aprender a tocar piano, tendo trocado várias vezes de professor. Viúvo de uma pianista, ele agora passa seus dias sozinho, dando poucas aulas e reservando tempo para escrever um livro. Sua vida muda ao ter que ir para Nova York falar em um congresso. Ao chegar ao apartamento que tem na cidade, mas que não visitava há anos, ele encontra um casal de imigrantes morando lá. Tarek (Haas Sleiman) é um percussionista da Síria, e sua mulher Zainab (Danai Gurira) é do Senegal e vende bijuterias. Os dois foram enganados por um homem que se dizia dono do apartamento e já estavam morando lá há dois meses. Inicialmente Walter os manda embora, mas muda de idéia e acaba deixando que eles permaneçam ali até encontrarem outro lugar. Uma improvável amizade se estabelece entre Walter e Tarek, que têm um amor em comum, a música. Richard Jenkins, que concorreu ao Oscar de melhor ator por este filme, é minimalista ao fazer de Walter Vale um senhor aparentemente sem nenhum atrativo. Aos poucos, porém, percebemos que ele não é má pessoa. Apenas passou muito tempo sozinho e sem desafios. O encontro com o jovem casal de imigrantes desperta nele as memórias da própria esposa e a vontade de fazer algo diferente da vida. Aos poucos Walter começa a ter aulas de tambor com Tarek e há cenas muito engraçadas dos dois batucando.
Acontece, no entando, de Tarek ser preso injustamente pela polícia de Nova York. Como está no país ilegalmente, ele é enviado a um presídio da imigração no Queens, bairro afastado de Nova York. Walter está tão envolvido com o percussionista que passa a visitá-lo na prisão e tenta encontrar uma saída para o problema. Ele também tem que lidar com a mãe de Tarek, Mouna (Hian Abbass, do belo "Lemon Tree"), que vem de Michigan procurar pelo filho. Aos poucos Walter descobre como é difícil a vida para um imigrante ilegal nos Estados Unidos quando este é preso pela imigração. Tarek pode ser enviado para qualquer parte do país ou mesmo deportado sem aviso prévio, e os oficiais da imigração não estão dispostos a dar muitas informações.
O filme poderia cair em um drama fácil ou em um protesto político superficial, mas mantém o foco no lado humano dos personagens. Walter, ao se envolver com os imigrantes, percebe como sua vida tem sido vazia, e a presença feminina de Mouna também desperta sentimentos há muito esquecidos. A trama me lembrou do filme que Peter Weir fez em 1990, "Green Card, Passaporte para o Amor", em que Gerard Depardieu simulava um casamento com Andie MacDowell para tentar ficar nos Estados Unidos. As duas produções tem a música como um dos focos principais (o personagem de Depardieu também era músico) e em ambos aparece um músico de rua que toca percussão em uma lata. "O visitante", porém, é um filme mais sério e mais realista sobre as condições de vida nos Estados Unidos. Digamos que "Green Card" seja uma fantasia dos tempos anteriores ao 11 de setembro, enquanto que "O Visitante" mostre como o mundo mudou, infelizmente para pior, nesse período.
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