Antes de começar, dois avisos: a resenha a seguir contém opiniões minhas sobre eutanásia. Segundo aviso: caso não tenha visto o filme e não queira saber de detalhes, recomendo que alugue o DVD e depois volte aqui.
Avisos dados, assisti hoje na CPFL Campinas, em 35 mm, a este filme do diretor chileno Alejandro Amenábar. Baseado em fatos reais, trata da história de Ramón Sampedro (o excelente Javier Bardem), um homem divertido, inteligente, capaz de escrever belos poemas e debater arduamente com qualquer pessoa sobre o que acha certo.
Há quase trinta anos Ramón vive em uma cama, na casa de seu irmão mais velho. Quando tinha 19 anos, um mergulho mal calculado no mar resultou em uma vértebra quebrada e na paralisia total dos membros abaixo do pescoço. Ramón acredita que deveria ter morrido naquele acidente e, desde então, tem tentado convencer as autoridades (e qualquer pessoa que queira escutar) a permitirem que ele morra com "dignidade". Ele contata uma associação que promete lutar pelo "direito de escolha", que lhe envia uma bela advogada, Julia (Belém Rueda), para tratar de seu caso. É um tema polêmico e minha opinião é a de que eutanásia poderia ser pensada, no máximo, em algum caso de dor e sofrimento extremos. Mas é complicado ver um homem inteligente e, ironicamente, cheio de "vida" como Ramón lutando tão bravamente para tentar terminar com a própria existência. Como cinema, "Mar Adentro" é um grande filme.
Há de se louvar a decisão de não transformá-lo em um simples panfleto pró (ou anti) eutanásia. É, antes de tudo, um filme sobre grandes pessoas, passando por uma situação difícil e polêmica. Ramón mora com o irmão mais velho (que é totalmente contra as idéias suicidas dele), com a cunhada Manuela (Mabel Rivera), o sobrinho Javi (Tamar Novas) e seu velho pai. Todos tomam conta de uma pequena chácara e cuidam de Ramón. Quando as notícias sobre o pedido dele ao Estado pedindo a eutanásia chegam à imprensa, um padre (também tetraplégico) aparece na televisão e diz que Ramón só está querendo chamar a atenção da família, que não lhe daria amor o suficiente, o que deixa todos revoltados. Há uma seqüência muito bem escrita, e engraçada, em que este padre vai visitar Ramón e os dois têm um debate interessante sobre razão versus religião. E há as mulheres que, cada um a seu modo, são apaixonadas por ele. A primeira é a própria cunhada Manuela, que trata dele como a um filho. A advogada Julia também acaba se apaixonando por ele e, ao descobrirmos que ela tem uma doença degenerativa, ela se torna uma possível aliada em um ato suicida de amor. E há Rosa (Lola Dueñas), uma operária simples, mãe de dois filhos, que vê Ramón na televisão e se torna sua amiga, tentando a todo custo fazer com que ele mude de idéia.
Tecnicamente, o diretor Almenabár constrói várias seqüências muito bem feitas mostrando passagens de tempo e, mais poeticamente, os sonhos e fantasias que Ramón tem ao imaginar que está livre da paralisia. Alejandro Almenabár também assina o roteiro, a edição e, pásmem, a trilha sonora do filme. "Mar Adentro" ganhou o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro de 2004.
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