O tema da procura pela figura paterna também estava presente em "Central do Brasil", e aqui é bastante forte. Não sabemos quem são os pais dos filhos de Cleuza, nem do que está para nascer. O mais novo é quem está mais determinado a descobrir suas origens, e há ecos do seu personagem com o de Josué de "Central do Brasil", como a vontade de aprender a dirigir. A trama é linear e acompanha a trajetória destes cinco personagens, mãe e filhos, na luta para sobreviver e tentar melhorar de vida. Não é um tema fácil, mas achei que Salles e Thomas carregaram um pouco na mão. O início é muito bom. Uma montagem paralela estabelece a relação entre os personagens e as paixões típicas do brasileiro: futebol e fé. Dario é visto disputando uma seletiva para tentar ser escolhido para um time de futebol. Enquanto isso vemos sua mãe Cleuza em meio à gigantesca torcida corinthiana, no Morumbi, em um clássico contra o São Paulo. A montagem intercala planos dos jogadores profissionais com os de Dario jogando na várzea, com grande efeito. Também é interessante a ligação entre a fé dos torcedores misturada com cenas da fé de Dinho em um culto evangélico.
A direção de fotografia, de Mauro Pinheiro Jr, dá ao filme um tom semidocumental, com muita câmera na mão e iluminação natural. São Paulo é vista sempre com um visual "sujo" e sob chuva. A trilha "new age" é do oscarizado Gustavo Santaolalla. O roteiro (de Daniela Thomas e George Moura), nem sempre dá conta de acompanhar os personagens como deveria. O destino do motoboy, por exemplo, e sua transição para o crime, me pareceu um tanto simplista. O melhor desenvolvido é Dario, que representa o brasileiro comum, com muito talento, mas com falta de oportunidades para se desenvolver. Todos sabem que ele é um bom jogador de futebol, mas ele tem contra a idade (que já passou do ponto de corte dos clubes) e a falta de dinheiro para "molhar a mão" dos olheiros. Por um momento achei que o tom pesado do filme seria levado às últimas conseqüências, mas o final, em aberto, deixa lugar para alguma esperança. Mas sem dúvida não é o mesmo tipo de esperança do final de "Central". Uma década depois, o olhar de Walter Salles me pareceu mais pessimista e desesperançoso com relação ao Brasil e seus habitantes.
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